ACTAS  
 
8/29/2015
Simulação de Assembleia: Estabelecer o voto obrigatório
 
Nuno Matias

Vamos agora ser céleres na preparação do quarto debate. O Governo será Castanho, à nossa direita será a Oposição 1, Encarnado, e à nossa esquerda a Oposição 2 será Cinzento.

Pedia para serem mais rápidos.

Vamos ter que começar o debate…

Vamos dar início ao quarto debate. A proposta é "O estabelecimento do voto obrigatório”. Tem a palavra por cinco minutos o Primeiro-ministro do Governo Castanho, João Pedro Cruz. Dispõe de cinco minutos.
 
João Pedro Cruz

Exma. senhora Presidente da Mesa, senhores deputados, o XII Governo Constitucional da República Portuguesa, hoje, vai dar um enorme impulso para o futuro da Democracia portuguesa. Com base na Constituição da República Portuguesa, no artigo 109.º, e passo a citar: "A participação direta e ativa de homens e mulheres na vida política constitui condição e instrumento fundamental de consolidação do sistema democrático” - fim de citação. Pelo que o voto é um direito e um ato de liberdade. Para além de ser um direito e ato de liberdade, tem também deveres conectados. O voto é um direito, constitui um ato universal, é periódico e deve ser secreto.

Por isso, nós propomos o estabelecimento da obrigatoriedade do voto e que tem como enfoque principal, e não menos relevante, combater o flagelo que temos na nossa abstenção do país.

Num segundo enfoque, por um caráter pedagógico, para consciencializar os cidadãos para terem uma atividade política mais ativa do que aquela que nós temos.

Num terceiro enfoque, e não menos relevante, aumentar a mobilização dos portugueses para este ato democrático. A insatisfação crescente da população portuguesa na vida política leva continuamente ao seu afastamento, pelo que o ato obrigatório permitirá – repito - permitirá aos portugueses incutirem nas suas consciências em quem devem votar.

A política e a existência de obrigatoriedade de voto existe atualmente em 24 democracias. Compete essa atribuição de vontade política ao direito livre das pessoas e cidadãos terem em democracia esse direito inerente, pelo que exemplos como o Luxemburgo e a Bélgica defenderem este tipo de obrigatoriedade de voto. Países, como vocês sabem, que levaram à fundação da nossa que, é hoje, a União Europeia.

Por isso, não votar ensombra a Democracia e transmite a ideia de um povo desinformado e desinteressado com o seu próprio bem-estar, revelando ser uma autoexclusão da Democracia.

Numa última análise, a obrigatoriedade de voto contribui para uma sociedade civil mais bem preparada para garantir uma Democracia madura e próspera. Caros deputados, caras deputadas o vosso voto é… o futuro da Democracia.

[APLAUSOS]

 
Nuno Matias
Tem agora a palavra para interpelar o Governo, pelo Grupo Parlamentar Encarnado, o deputado Ruben Reis. Dispõe de 3 minutos.
 
Rúben Reis

Muito obrigado senhor Presidente da Assembleia, senhor Primeiro-ministro, membros do Governo, senhores deputados e senhoras deputadas.

Esta proposta de lei não terá resultados nenhuns. Estas medidas são bem-intencionadas, senhores deputados. Estamos na Assembleia da República, mas é pouco. Temos que fazer melhor. Estas medidas são ambíguas e um ataque à Democracia de Portugal. O exercício de cidadania não deve ser imposto - se for, não é cidadania nem democracia. É um dever dos políticos e das máquinas partidárias ir ao encontro da população portuguesa e estimular a sua participação. Quando os senhores deputados apresentam um projeto de lei com o objetivo de combater, passo a citar, "o desinteresse e a desinformação do eleitorado”, e, por outro lado, escrevem no mesmo projeto de lei, passo a citar, artigo 4.º, n.º 1, al. a): "Fiquem excluídos automaticamente de qualquer concurso público a que se tenham candidatado ou que tencionem candidatar-se”. Bem, senhores deputados, isto é, no mínimo, caricato.

Por um lado, este projeto de lei quer informar o eleitor através da obrigação de voto. Mas, por outro, este projeto de lei quer impedir quem se abstém de participar no ensino público português?

O eleitor que comparece às urnas contra vontade, apenas para fugir às sanções previstas pela lei, não está a praticar um ato de consciência. Neste caso tenderá, muitas vezes, a votar no primeiro nome que lhe surgir ou simplesmente votando em branco, como forma de protesto, verificando-se assim um número elevado de votos nulos. Claramente, este não é o objetivo, esta não é a solução.

Se a consciência política de um povo ainda não está evoluída o suficiente, se acham isso, senhores deputados, não é tornando o voto obrigatório que se obterá essa transformação de uma sociedade. Porque se assim fosse, o Brasil, e a maioria dos países da América Latina, que adotaram o voto obrigatório, há muitas décadas estariam com os seus problemas sociais resolvidos.

Pois bem, na minha modesta opinião, a abstenção é um voto. É um voto na mudança e na reformulação partidária. A abstenção é um ato de negar ou de se eximir, de fazer opções políticas. Abster-se, num processo político, tem que ser visto como um aviso urgente de inovar, de criar e reformular a comunicação e o esclarecimento político. Muito obrigado.
 
Nuno Matias

Tem agora a palavra, pelo Grupo Parlamentar Cinzento, o deputado Gabriel Albuquerque. Dispõe de 3 minutos.

 
Gabriel Mateus de Albuquerque

Obrigado pela palavra, senhor Presidente da Assembleia; membros do Governo, Primeiro-ministro;

Eu acho bastante curioso, e no mínimo caricato, que o Sr. Primeiro-ministro fale em liberdade quando, ao mesmo tempo, afirma que é obrigatório votar.

Para começar, eu gostaria então de referir a definição de democracia. Democracia é uma palavra que vem da Grécia antiga e quer dizer Demos, ou seja, Povo, e Cracia, que é o Poder. Ou seja, democracia significa o poder do povo, o povo soberano e livre. A Nação está assente em dois princípios: o da igualdade e o da liberdade. E é exatamente sobre essa liberdade que gostava de questioná-lo. O Sr. Primeiro-ministro acha que é credível ser um país livre e ao mesmo tempo obrigar os cidadãos a votar?

Em resposta a esta pergunta, eu gostaria de referir três argumentos.

O primeiro, o argumento constitucional. Deixe-me dizer que esta medida é inconstitucional porque, segundo o artigo 49.º, ponto 2, da Constituição da República Portuguesa, votar é um dever cívico, não um dever jurídico. Logo, não é possível serem penalizados aqueles que não votam, como está na sua proposta de lei.

O segundo argumento é o argumento histórico. E deixe-me dizer que é bastante curioso - e leva-me a pensar que nenhum dos membros do Governo frequentou as aulas de História -, porque em 1933 as eleições constituintes foram feitas com voto obrigatório, mas eleições constituintes anti parlamentaristas do Estado Novo de um cunho salazarista.

Portanto, se é isso que defende, Sr. Primeiro-ministro, voltemos aos tempos do passado e eu digo-lhe: houve um homem que contrapôs este ponto e que sempre defendeu a liberdade de voto – chamava-se Francisco Sá Carneiro. E passarei a citar: "a pessoa humana define-se pela liberdade; ser Homem é ser livre. Ser contra a liberdade é despersonalizar; suprimi-la desumaniza; a liberdade de pensar é a liberdade de ser, pois implica a liberdade de exprimir o pensamento e de o realizar na ação.”

Por último, o terceiro argumento, é o argumento de falta de lógica na sua medida. Para começar, porque quem…

 
Nuno Matias

Dispõe de 30 segundos.

 
Gabriel Mateus de Albuquerque

Quem obriga o povo a votar acredita que o povo é irresponsável, que por si só não votaria. Logo, é o povo que lhe dá legitimidade para governar. É, no mínimo, icónico, caricato, que as pessoas que lhe dão autoridade para governar as considere irresponsáveis. Por último, apenas dizer que eu não posso pactuar com medidas que atacam a liberdade do povo português, porque o voto deve ser livre e porque a Democracia é um exercício de liberdade. Obrigado.

[APLAUSOS]

 
Nuno Matias

Muito obrigado. Para dar as respostas, o Governo Castanho, o Ministro Fábio Maxial. Dispõe de 3 minutos.

 
Fábio Machial

Obrigado senhor Presidente da Mesa.

Senhores deputados, respondendo e fazendo um comentário ao deputado Ruben, que diz: ser um país livre e votar… Eu faço a lembrança de que a Bélgica, que considero um país livre, tem o voto obrigatório. O Luxemburgo, considero-o um país livre, tem o voto obrigatório. Para nós a abstenção representa o auto excluir-se de um dever cívico mas, acima de tudo, de um direito fundamental sobre o qual assenta a génese do próprio regime democrático. Com isto, a abstenção representa um desprezo pela Democracia.

Para ilustrar esta situação recorro a um gráfico com a evolução da abstenção desde 1975.

[APLAUSOS]

Senhor deputado, desde 1975 já temos mais de 40 anos de democracia, mais de 14 atos eleitorais, e sabe em quantos diminuiu a abstenção? Em apenas três, senhor deputado, e com uma descida nunca superior a 3%. Se a isto adicionarmos os atos presidenciais e os atos europeus, temos 29 atos. Só em seis diminuiu a abstenção, senhor deputado. Se considera que instituir o voto obrigatório é deixar de ser um país livre, então não sei o que anda aqui a fazer nesta Câmara.

Mais: disse que era uma medida bem-intencionada. Pois é, nós não fazemos nada mal intencionado, senhor deputado.

[APLAUSOS]

O senhor, já não sei qual dos deputados foi… referiu Francisco Sá Carneiro. Foi o deputado Gabriel.

 
Nuno Matias

Dispõe de 30 segundos.

 
Fábio Machial

Se cita Francisco Sá Carneiro, eu cito Paulo Rangel, que diz que a ascensão dos partidos radicalistas, tanto de esquerda como de direita, no continente europeu, são um sério perigo na conservação da nossa democracia então implementada, uma vez que em função… os votos radicalistas não são tão significativos como a abstenção. E assim termino a minha…

[APLAUSOS]

 
Nuno Matias

Muito obrigado, terminado o debate, vamos então pedir aos grupos que não participaram que votem. E pedia em primeiro lugar que quem entende que o Governo ganhou o debate possa levantar o braço…

Pedia era que todos levantassem bem o braço para a contagem ser o mais eficaz possível.

A oposição não vota, certamente.

Muito obrigado. Quem entende que foi a Oposição 1?

Muito obrigado. Quem entende que foi a Oposição 2?

Parece-me que é evidente, mas…

Muito obrigado. Parece-me que é evidente que a Oposição 2 ganhou o debate.

Em relação ao tema e à vossa opinião pessoal em relação ao tema, quem é a favor de estabelecer o voto como obrigatório?

Podem baixar. Quem é contra?

Parece-me que é claro: a maioria é contra o estabelecer do voto obrigatório.

 
Duarte Marques

Muito obrigado. Parabéns... Vou deixar o Gabriel para o final. Vou fazer algumas criticazinhas para vos ajudar a corrigir.

O João Pedro é muito melhor a falar sem papel do que com papel. E muito menos com a tua letra, que deve ser pior do que a minha. E o teu erro foi esse… tu lá fora falas muito bem, aqui atrapalhaste-te e perdeste por isso. Eu digo-te isto à vontade porque és um tipo com força. Parecias um basquetebolista, estiveste assim com a mão o tempo todo. Tens de ter cuidado com isso, estavas a jogar basquete. Depois há uma altura em que pões a mão na mesa – tu fizeste o mesmo, Ruben -, e começas a fazer assim… têm que ter cuidado por causa do microfone, que, se estiver ligado, isto ouve-se. Tu ficaste muito nervoso. Ou escreves a computador ou não escreves e falas com maior improviso, tu és capaz de fazer isso. E o erro de falar sincopado, à Luís Pedro Mota Soares, tu fizeste o mesmo, e não devias fazer isso, tu não falas normalmente assim. Depois tens um papel na mão e estás a tremer, nós estávamos todos a olhar para o papel e a olhar para a tua mão e esquecemos o resto. E tu tinhas bons argumentos. Aprende com isto que vale a pena, porque tu fazes muito melhor de certeza.

O Ruben também falou muito sincopado, e tu és de arrufos. Tens umas frases bem feitas, tens alguns argumentos bons, mas está a respirar e a levantar e vai... e já há dias fizeste isso. Tens que ter cuidado com isso porque depois não és eficaz na mensagem, por mais que ela seja boa, a mensagem não passa. Tens que ser mais regular, não podes ser tanto com os altos e com os baixos, como estavas a falar.

O Fábio – eu acho que o Governo pecou nisso – perdeu muito tempo com o argumento de que há outros países que são assim. Agarrou-se muito a isso. Eu achava que tu te ias espalhar e ficares por aí. Mas tu quase conseguiste dar a volta. Estiveste muito bem na parte final quando usaste o argumento da abstenção. Aquela frase de que a abstenção é o desprezo da Democracia é brutal. E a única crítica que eu te faço, tens que ter cuidado, tu és um bocadinho bruto a falar. Fazes-me lembrar alguém que eu conheço chamado Duarte Marques. E isso às vezes transmite arrogância. E tu és um tipo que tens uma voz muito forte e carregas nela. Tens que ter cuidado porque isso prejudica-te. Porque tens boa voz, tens boa postura, tens bom improviso, mas tenta não ser tão bruto. Alguém que te diz isto é alguém que é bruto e que se tenta moderar todos os dias.

Eu ao Gabriel só digo uma coisa: não te deslumbres, evolui sempre. Com a tua idade fazer o que tu fizeste não é habitual. Já muitos aqui com 16 anos o fizeram, ou 17, os miúdos mais novos às vezes revelam-se. Tu foste perfeito. Foi talvez a melhor intervenção até agora, comparando com uma outra... foi muito bom.

Agora só te digo uma coisa: tens tudo para te espalhares, já vi vários a espalharem-se. Se eu te vir a espalhar um dia, levas uma lambada. Porque tu tens uma coisa que se tem… e portanto não desperdices isso. Tem muita humildade, porque a humildade é muito mais importante do que a qualidade, às vezes. E a arrogância estraga tudo. Portanto, a única coisa que eu tenho para dizer é: não te deslumbres, evolui sempre, e tem respeito pelos outros, tem respeito pelos teus amigos, trabalhar em grupo… mas tu tens tudo para ter sucesso, porque tu tens muito jeito. Parabéns.
 
Dep.Carlos Coelho

Eu concordo com aquilo que o Duarte disse relativamente ao Governo. O Fábio esteve muito bem, voltou grande parte dos argumentos contrários. E o Ruben deve sentir-se lisonjeado porque grande parte da contra argumentação do Fábio foi para desmontar argumentos do Ruben. O Ruben diz "tão bem intencionados”, diz o Fábio: não fazemos nada mal intencionado. O Ruben diz "olhem o caso do Brasil”, e ele responde olhem o caso da Bélgica e do Luxemburgo. O Ruben diz "a cidadania não é cidadania quando é imposta” e o Fábio responde: a abstenção é o desprezo pela democracia. Houve um ténis entre os dois, um ténis de argumentação muito bom. Acho que foi dos melhores pingue-pongues de argumentação até agora.

Agora, eu do João Pedro, para lá de concordar com o que o Duarte disse sobre o papel, se a vossa tática na apresentação tivesse correspondido à vossa tática na resposta, vocês teriam ganho.

Há uma coisa que eu não vos disse, e devia se calhar ter dito no início deste exercício: nós pomos este cenário para fazer ambiente, mas vocês não têm que pensar em "parlamentês”, vocês têm que pensar em convencer. Ignorem que estão aqui. Vocês querem dizer que o voto tem que ser obrigatório. Eu acho que o que vocês têm que pôr em cima da mesa é razões para isso, argumentos para isso. E não faltam argumentos; o Fábio invocou-os no final. Basta estarmos confrontados com o número de pessoas que não votam, o número de portugueses que ficam fora da democracia, o número de portugueses que não têm o direito depois de se queixarem disto porque são os outros que decidem por eles. Vocês podem dar exemplos de decisões concretas que são mais polémicas e dizer: vocês concordam com isto? Metade dos portugueses não votaram. Há formas concretas de explicar que a não participação está a enfraquecer a Democracia. Não digo que isto necessariamente justifique o voto obrigatório, mas cria o cenário para depois o Governo vender a sua proposta. E isso vocês não fizeram.

Termino com o Gabriel, também. Gabriel, não quero ser paternalista, não quero ser paternalista. Mas é notável que o mais jovem participante da Universidade de Verão, com 16 aninhos feitos, tenha dado a prova de excelente participação parlamentar que você deu no exercício que acabou de fazer.

[APLAUSOS]

 
Duarte Marques

Ó Gabriel, deixa-me só dizer-te uma coisa. Eu tenho um ou dois amigos meus que vieram aqui já durante estes dez anos e foram como tu – tão bons ou melhores. O erro deles… e houve outros que correram igualmente bem e hoje são grandes lideres políticos. Há dois deles que cometeram um grande erro – tornaram-se velhos demasiado novos. Não cometas esse erro. A malta anda sempre de fato e gravata, são uns chatos, ninguém os ouve, não conseguem falar com os colegas da idade deles, são uns chatos, mesmo chatos. Não cometas esse erro. Quando tiveres que falar do Orçamento de Estado, lá mais para a frente… agora outras coisas. Mete essa qualidade aí, está bem?

[APLAUSOS]