ACTAS  
 
8/29/2015
Simulação de Assembleia: Criar círculos uninominais
 
Nuno Matias

Mas tem a ver com o jogo pedagógico, única e exclusivamente. Ordens superiores.

Vamos para o debate número 10. Vou pedir ao Grupo Cinzento que tome o lugar do Governo, e ao Grupo Azul que fique à nossa direita para fazer a Oposição 1 e ao Grupo Amarelo que se situe à nossa esquerda para fazer a Oposição 2.

Vamos então dar início ao ponto 10 da Ordem de Trabalhos. A proposta é criar círculos uninominais. Tem a palavra pelo Governo Cinzento o ministro Diogo Correia. Dispõe de 5 minutos.

 
Diogo Correia

Obrigado, senhor Presidente da Mesa.

Senhoras e senhores deputados, 41,9% - esta é a percentagem de portugueses que não votou nas últimas eleições legislativas. Isto significa que em cada 100 portugueses 41 ficaram em casa na hora de exercer o seu direito de voto.

Acrescento ainda quatro questões. Quantos dos senhores deputados cumpriram o mandato até ao final da legislatura? Quantos do senhores deputados cumpriram com a obrigação de prestar contas aos eleitores? Quantos dos senhores deputados são conhecidos pelos cidadãos que vos elegeram? E quantos dos senhores deputados não são paraquedistas?

Este elenco governativo traz ao debate parlamentar a reforma do sistema eleitoral para a Assembleia da República. Porquê? Porque para nós é essencial resolver este problema. O problema de os portugueses não votarem por não se sentirem representados. De acordo com dados estatísticos da Pordata, verifica-se que a taxa de abstenção tem aumentado incessantemente ao longo dos anos.

Após a consagração da democracia, tivemos nas primeiras eleições livres uma taxa de abstenção de 8,5%. Isto indica que, desde as primeiras eleições até às últimas realizadas em 2011, a taxa de abstenção aumentou 33,4%, atingindo os atuais 41,9%.

Este indicador é demonstrativo da falta de representatividade sentida pelos portugueses, a qual, por sua vez, está associada à falta de responsabilização que é atribuída aos deputados eleitos.

São os portugueses que nos conferem a legitimidade para governar. Como tal, cabe-nos defender os seus interesses. E é precisamente isto que esta proposta de lei pretende fazer: resolver o problema da falta de representatividade através de um sistema eleitoral com círculos uninominais, o qual aproxima eleitores e eleitos.

A proposta de lei n.º 100/X cria um círculo plurinominal e círculos uninominais. Para além disso, e consequentemente, introduz um sistema de voto: um no círculo plurinominal e outro no círculo uninominal.

Consideramos que a existência deste sistema eleitoral cumpre dois objetivos fundamentais da Democracia: a representatividade e a governabilidade. Apesar de o atual sistema eleitoral assegurar condições favoráveis de governabilidade, verifica-se que subsiste um défice de representatividade, o qual é colmatado pela introdução dos círculos uninominais.

Além do mais, a conjugação destes círculos com um círculo nacional plurinominal permite manter a representação de partidos políticos com menor expressão na Assembleia da República. Isto significa que a pluralidade de opiniões desta câmara é mantida naquilo que é um ponto fundamental e é sinónimo de uma democracia madura.

A aplicação deste sistema eleitoral aproximará os cidadãos e os deputados, permitindo uma relação direta entre o eleito e o eleitor, naquilo que é um aumento da personalização do mandato. Assim, diminui a possibilidade, como atualmente acontece, que um deputado seja eleito por uma região à qual não pertence. Ou seja, reduz-se o número de paraquedistas que apenas utilizam o círculo como forma de chegar à Assembleia da República e não como resultado do conhecimento da realidade local.

Francisco Sá Carneiro dizia que o homem é a medida e o fim de toda a atividade politica. Este modelo eleitoral significa mais transparência, mais satisfação dos eleitores…

 
Nuno Matias

Dispõe de 30 segundos.

 
Diogo Correia

…com o sistema democrático, colocando, tal como Sá Carneiro preconizava, o homem no centro da atividade política. Obrigado.

[APLAUSOS]

 
Nuno Matias

Tem agora a palavra para uma interpelação, pelo Partido Azul, o deputado João Gomes Ferreira. Dispõe de 3 minutos.

 
João Gomes Ferreira

Antes de mais boa tarde, para o Presidente da Assembleia, os membros do Governo e os senhores e senhoras deputados.

Por acaso não sou paraquedista, porque os desportos radicais não são assim a minha coisa. Mas é melhor vir de paraquedas do que vir com uma proposta desse género e cair de cara.

[APLAUSOS]

É que, face ao Decreto-lei aqui apresentado hoje, eu vejo-me obrigado a expressar o meu desapontamento com as prioridades do Governo. Porque, como é possível que, com tantos outros problemas e nesta altura do campeonato, se venha aqui gastar tempo e energia numa coisa destas? Numa reforma política que, não só está fora do contexto nacional, como está mal pensada e seria mal aplicada.

Vieram propor um sistema que não é nada de novo. Não é uma experiência nova, não foi o senhor Primeiro-ministro que inventou os círculos uninominais, nem a versão que trouxeram aqui para a Assembleia, na forma de Decreto-lei, em que é o mix, o 50/50, com o aspeto uninominal e o aspeto plurinominal. Ou seja, este tipo de sistema está presente já em países vizinhos, nos quais se pode ver o que está a correr bem e o que está a correr mal.

Eu acho que não custava nada terem feito o trabalho de casa e, se calhar, olhado para o que aconteceu nas recentes eleições britânicas, em que se viu ou se revelou o problema com este género de sistema. É que, por exemplo, o UKIP - UK Independence Party – que é o terceiro partido político daquele Reino Unido, obteve 12,7% dos votos da Nação total. No entanto, aquilo que conta é a representação no Parlamento, e obtiveram 0,2%. Ou seja, de quase 13% para 0,2%?

E pior ainda. Um partido que é uma minoria – que é o Social Democratics -, que foram com 0,3% do voto da população total, receberam 0,5% de representação no parlamento.

 
Nuno Matias

Dispõe de 30 segundos.

 
João Gomes Ferreira

Isto é uma disparidade proporcional populacional de 127 vezes. Ou seja, mesmo que fizessem um mix de 50/50 amortizavam só metade. E 64 vezes de uma diferença é ridículo na representação democrática.

Ou seja, trouxeram uma medida para tratar um não-problema que vai causar mais problemas, e na minha opinião, e do Partido Azul, bem pior do que não inovar é cometer os erros dos outros.

 
Nuno Matias

Muito obrigado, tem que terminar.

Tem agora a palavra pelo Partido Amarelo o Deputado Miguel Sousa. Dispõe de 3 minutos.

 
Miguel Sousa

Senhor Presidente, senhoras e senhores deputados;

A proposta de lei aqui apresentada contém algumas incoerências. A primeira é que o Governo quer garantir com esta lei uma maior proximidade entre os eleitores e os eleitos. Os círculos uninominais não garantem uma maior proximidade entre os eleitores e os eleitos, como é visível, aliás, no Reino Unido, e como ouvi ontem o Dr. Luís Montenegro dizer a mesma coisa.

Mais: esta proposta é igual à utilizada na Alemanha. Pois bem, meus caros, Portugal não é a Alemanha. A Alemanha é um país federal que dispõe de Estados separados e Portugal é uma República unitária, não está dividida por Estados. E os senhores o que parece é que querem dividir o país.

A segunda incoerência é – como está representado no artigo 2.º desta proposta – garantir um sistema que assuma a representatividade dos eleitores. A minha pergunta é: como?

No artigo 3.º da vossa proposta os senhores mantêm o número de 230 deputados na Assembleia. Ora, Portugal tem 308 municípios e, de acordo com o artigo 6.º presente na vossa proposta, 114 lugares na Assembleia estão reservados para um círculo nacional. Restam 116 para os círculos uninominais. Admitindo que é eleito um deputado por município, onde é que os senhores pensam colocar os restantes 192? É uma questão de fazer as contas…

[APLAUSOS]

Por último, e para mim a incoerência mais graves de todas, é o duplo voto, como é proposto no artigo 5.º. Os senhores propõem um voto para o círculo nacional e um voto para o círculo uninominal. Ou seja, seriam eleitos deputados de primeira, que representariam nacionalmente, e deputados de segunda, que representaria localmente. Pois quer-me parecer que não só querem dividir o país como também querem dividir esta Assembleia. Muito obrigado.
 
Nuno Matias

Tem agora a palavra para dar as respostas pelo Governo Cinzento, a Primeira-ministra Mafalda Moutinho. Dispõe de 3 minutos.

 
Mafalda Gonçalves Moutinho

Obrigada, senhor Presidente.

Senhoras e senhores deputados, eu vou tentar em pouco tempo responder às perguntas formuladas pelos deputados da Oposição, relativamente à proposta que hoje trazemos a debate parlamentar.

A representação proporcional não cria condições para o surgimento de vários partidos. Impede, isso sim, ou dificulta seriamente que um deles obtenha a maioria absoluta. Desta forma, os pequenos partidos, tantas vezes com uns meros 7% e 8% dos votos, como o dos senhores deputados, acabam por deter uma influência e um poder muito superior ao que, fruto da mera contagem de votos, deveriam dispor.

O que os partidos de V. Exas. temem, com o sistema uninominal, não é o seu desaparecimento, mas a sua irrelevância eleitoral, o que não se entende. Os senhores deveriam, ao invés, perguntar-se por que razão nada se faz para mudar.

Referem que o sistema não assegura maior representatividade dos eleitores? Estão claramente errados. Num regime de círculos uninominais, em que a escolha dos próprios candidatos tenderia naturalmente a ser local, o candidato eleito passaria a ser o efetivo representante do círculo, incluindo daqueles que votaram contra si, e cujos interesses, no seu próprio interesse, ele tenderia também a defender em sede parlamentar. Vivemos numa Democracia representativa, assim, maximizamos a mesma.

Em relação ao Reino Unido, eu creio que o senhor deputado não estudou muito bem o nosso programa, porque o Reino Unido tem círculos uninominais, não tem um sistema misto como o que nós aqui propomos. O sistema que nós propomos, no fundo, é o melhor de dois mundos.

Em relação a existirem deputados de primeira e de segunda, eu não sei se o senhor deputado se considera um deputado de segunda, mas a verdade é que o povo nos elegeu porque no nosso Programa de Governo tínhamos a criação de círculos uninominais.

Referem que nos afastamos dos eleitores com aquilo que propomos? Os círculos uninominais e as atuações dos deputados em cada um dos círculos não é feita de forma autónoma, estão comprometidos ao programa eleitoral do partido pelo qual se candidatam. Os círculos uninominais apenas fomentam a representatividade dos cidadãos, bem como a responsabilização direta do deputado que elegeram. Acreditamos que, a longo prazo, verificaremos que a taxa de abstenção diminuirá drasticamente. Falo de 41,9%.

Senhores deputados, o sistema tal como o conhecemos, tem que mudar. O que aqui hoje propomos faz de todos nós a seleção nacional de todos os portugueses. Foi para isso que eles nos elegeram. Obrigada.

[APLAUSOS]

 
Nuno Matias

Terminado o debate número 10, vamos agora pedir aos grupos não participantes neste debate que digam, no seu entender, quem ganhou.

Quem entende que foi o Governo?

Obrigado. Quem entende que foi a Oposição 1?

Convém que a decisão seja estável.

Quem entende que foi a Oposição 2?

Parece que é claro que foi a Oposição 1 que ganhou este debate.

[APLAUSOS]

Em relação à proposta em si, qual a vossa opinião? Quem é a favor desta solução?

Como diria a nossa Presidente, a contrario … parece-me que também é claro que resulta a contrario que são contra a criação de círculos uninominais.
 
Dep.Carlos Coelho

Se eu tivesse que votar eu não sei onde é que votaria, para ser sincero. E, portanto, felicito a vossa capacidade de decisão. Nós quando temos que decidir, temos que decidir, vocês decidiram, deram a vitória à Oposição 1. Eu não sei em quem é que votaria, porque não fiquei confortável com este debate.

O quê que eu achei dos diversos contributos? O Diogo Correia, inteligentemente, para não fazer uma intervenção monocórdica, decidiu adotar uma estrutura melódica. Isso foi uma estratégia inteligente e que é recomendável. O problema é que ele manteve sempre a mesma estrutura melódica. Agora não consigo repetir, mas imaginem que é esta (vou pegar num discurso vosso): nos últimos anos a Nação portuguesa passou um dos momentos mais complicados e sofridos da sua História. Devido à irresponsabilidade de um governo que não teve respeito, seriedade e competência, o país viu-se…

Ou seja, ele a ler o texto, se vocês ouvirem a gravação, a estrutura melódica é um bocadinho mais complexa, não é resumida a oito, é sempre a mesma. Mesmo num discurso curto de cinco minutos, as pessoas apercebem-se da estrutura melódica e cansam-se dela. Não sendo tecnicamente um discurso monocórdico, isto é, ele não lê de forma acética, ele não diz: nos últimos anos a Nação portuguesa passou um dos momentos mais complicados e sofridos da sua História. Devido à irresponsabilidade… ele não leu assim. Mas como a estrutura melódica é a mesma, passada a quarta ou quinta vez que nós ouvimos a mesma estrutura… é aquilo a que o Rodrigo Moita de Deus diz: faz-se zoning out. Isto é, o nosso ouvido habituou-se àquela música e já deixa de ter valor. Eu só consigo imprimir eficácia aos sublinhados daquilo que eu quero que vocês escutem, se alterar, surpreendentemente, a minha estrutura melódica. Isto é, se eu usar uma num momento e usar outra noutro momento. Portanto, para o Diogo, a minha crítica é a adoção da mesma estrutura melódica.

O João Gomes Ferreira começou muito bem com a piada do paraquedismo. É hilariante. Depois caiu. E depois, tal como aliás o Miguel de Sousa, vocês fazem grande parte da vossa argumentação a discutir números. Se é metade, se não é metade, percentagens… ou seja, vocês quantificaram o debate. Não há nada mais chato do que o discurso dos números. É por isso que nenhum de nós tem grande pachorra para o discurso da economia, já ninguém consegue… o número do défice, o do PIB per capita, o da dívida, a percentagem face ao não sei quê, o crescimento percentual, as tendências de subida ou as tendências de descida… os números… bem sei que os números podem transmitir realidade. Sei lá, se eu vos disser 120… estou a falar do peso do Duarte.

[APLAUSOS E RISOS]

Isto é um número que traduz… uma fotografia. Mas de uma forma geral, os números são acéticos, os números não traduzem nada. Os números são chatos. Nós temos é que falar em ideias, em pessoas, em políticas, em orientações, em dramas, em casos que as pessoas sintam. Nós vivemos, nós projetamos emoções relativamente a causas; é mais difícil projetar emoções relativamente a números. Fujam do discurso político dos números e vocês fizeram um discurso muito centrado nos números e isso não acho que vos tenha facilitado.

A Mafalda teve alguns sound bites bons, alguns um bocadinho injuriosos, os "pequenos deputados”, esteve bem no "é o melhor dos dois mundos”, esteve bem no argumento da coerência com o programa eleitoral. Teve uma pausa – a Mafalda ficou a pensar como é que ia usar os últimos segundos e bloqueou ali. Ora, a pausa é terrível, porque a pausa traduz insegurança, desqualifica quem faz a pausa, a menos que a pausa seja feita a olhar para vocês.

[PAUSA]

Perceberam? Se a pausa for feita a olhar para a assembleia eu não estou a interromper a comunicação, porque há linguagem visual. Mas ela não, ela fez a pausa e afundou-se no papel.

Na rádio é pior. Na rádio, se vocês fizerem uma pausa, a pessoa que está a ouvir-vos com rádio, acha que a emissão foi abaixo. Porque há um corte da comunicação. E isso foi a parte pior para a Mafalda. Também não gostei da gritaria depois no final, levantar a voz e aproximar o microfone, não esteve à altura do resto.

Portanto, moral da história: eu se estivesse do vosso lado não saberia em quem votar. Mas espero que possam aprender com aquilo que correu menos bem neste exercício para não o fazerem em circunstâncias reais.

 
Duarte Marques

Eu vou só dizer uma ou duas coisinhas muito rápidas. Eu acho que vocês só ganharam porque a piada dele inicial é genial. Mas foi só isso, e vocês ganharam por causa disso. Foi um momento que fez a diferença, porque eu acho que, juntando tudo, o Governo foi mais direitinho.

Concordo com aquilo que o Carlos disse do Diogo e acho que queria dizer o seguinte à Mafalda: a Mafalda evoluiu bastante desde que cá chegou. A Mafalda atrapalhava-se um bocadinho a falar no início e agora, apesar daquele "excitanço” final dela, ela falou muito bem e foi "cabrinha”. Ela mandou ali três ou quatro, ali pelo meio das conversas, que eu nunca esperei que ela o fizesse. Já aprendeu alguma manha, esteve muito bem, sem ofensa… percebeste? Foi esperta e meteu as facadas totais.

Relativamente aos números, eu há bocado fiquei baralhado, porque acho que foste tu… não, o do Grupo Amarelo, o Miguel, que várias vezes disse são 77 vezes mais a personalidade… eu estava já baralhado (foste tu?), e isso baralha um bocadinho. É óbvio que te podes estar a referir aos 35 cabelos do Carlos Coelho, mas isso a malta acha graça…

[APLAUSOS E RISOS]

Isto é o que se chama pôr uma coisa a talhe de foice ou então com uma grande calçadeira, mas há coisas piores. Felizmente o QI dele ainda é inferior ao número de cabelos.