ACTAS  
 
8/25/2015
Falar Claro
 
Simão Ribeiro

Quero começar por apresentar alguém que desde muito cedo é um daqueles que conserva a mística da Universidade de Verão. Nesta iniciativa, desde muito cedo tem formado muitos colegas vossos, geração após geração.

É alguém que trabalha desde os 15 anos, que passou pela Publicidade, pelo Jornalismo, passou também pelo Parlamento, alguém que fundou uma empresa muito cedo e que tem como hobby escrever.

A sua comida preferida são todas, infelizmente - junta-te ao clube; o animal preferido é o escorpião - vai-se lá saber por quê. O livro que sugere é "Diálogo no Inferno entre Maquiavel e Montesquieu” e o filme é "Henrique V” de Kenneth Branagh. A qualidade pessoal que mais aprecia é a sagacidade.

Convosco, Rodrigo Moita de Deus.

[APLAUSOS]

Evidentemente que dispensa apresentações o nosso outro orador nesta aula que já é das mais míticas da Universidade de Verão, o nosso magnífico reitor, Carlos Coelho.

[APLAUSOS]

 
Dep.Carlos Coelho

O aplauso é para vocês. Tinha-vos pedido para darem uma prova de que a edição de 2015 não era diferente sob o ponto de vista do rigor e da pontualidade das outras edições e vocês deram essa prova. Estavam todos cá antes das dez da manhã.

Começamos a Universidade de Verão com o pé direito e portanto o aplauso é para todos vós.

Foi-vos distribuída uma brochura no início. Há muitas coisas que estão na brochura que não vão estar nesta apresentação. A apresentação está grande demais e o Rodrigo e eu tentámos limitá-la. Por exemplo, não há nenhuma referência na nossa apresentação sobre o "Escrever Claro” que está na vossa brochura. Portanto, há mais informação na brochura do que propriamente na nossa apresentação.

Como ouviram, há um jogo semântico na designação da nossa aula: "Falar Claro” porque não concebemos a política sem a comunicação e "Falar Claro” porque queremos que as pessoas nos entendam. Este "Falar Claro” vai ter quatro partes: uma sobre comunicar bem, outra sobre contactos com a Comunicação Social, uma parte sobre os próprios meios e finalmente 15 conselhos para falar em público. São estas as quatro partes da nossa comunicação.

Vamos, portanto, começar com o "comunicar bem”. Por que é para nós tão importante comunicar? Porque fazer política é comunicar - esta é a ideia forte que gostaríamos de ter como partida.

No Irão, quem manda é quem tem legitimidade religiosa, é o Ayatollah que manda no país. Na Coreia do Norte quem manda é quem é o filho do ditador anterior, é uma herança dinástica como se fosse uma monarquia.

Em Democracia quem tem o poder é o povo; é o povo quem decide. Portanto, de nada vale nós sermos os melhores se não formos capazes de comunicar. Temos de comunicar com quem decide e esta é a razão do valor estratégico da comunicação numa democracia.

Comunicar significa explicarmos o que está a acontecer, o que se está a fazer, como e por quê. O que significa que comunicar não é apenas um instrumento para ganhar o poder, mas também um para justificar o poder. Comunica-se quando se está na oposição para se ganhar o poder, mas também se comunica quando se está no poder para ter esta capacidade de falar com quem decide.

Temos de ter a capacidade de perceber que comunicar não é só falar, é também saber ouvir, perceber o que as pessoas entendem, quais são os seus anseios e os seus problemas e necessidades.

Ou seja, em qualquer domínio da nossa intervenção social e particularmente na política, grande parte do nosso sucesso está dependente da nossa capacidade de comunicar, falar e ouvir.

Os três elementos da comunicação são o emissor, o recetor e aquilo que os liga que é a mensagem. Esta é a lógica da comunicação e só há comunicação quando há estes três componentes. O que significa que a mensagem é o que liga o emissor ao recetor.

Imaginem a comunicação mais brilhante que já ouviram na vida, aquela que é a mais arrebatadora, feita aqui na Universidade de Verão neste momento pelo melhor orador do Mundo, que é chinês. De nada vale ele ser muito bom. Como presumo que aqui na sala ninguém compreende chinês não há comunicação. Ele pode falar o que ele quiser, vocês podem ouvir o que ele está a falar mas não está estabelecida a ligação.

Vão dizer que isto é uma metáfora simples, toda a gente percebe que quem não fala não entende o chinês, muito bem, mas não é só isso. Para a comunicação ser linear tem de haver sintonia, isto é, temos de perceber aquilo que as pessoas estão a dizer mas temos de perceber bem.

Para haver sintonia tem de haver afinamento da comunicação. O que significa que é totalmente diferente falarmos para uma assembleia de idosos ou para uma assembleia de jovens; para uma associação de advogados ou para um clube de pescadores; para uma assembleia do partido ou na Assembleia da República. Assim como é totalmente diferente fazer uma conferência na Academia das Ciências ou fazer um comício partidário.

A linguagem, as metáforas, os exemplos, têm de ser adaptados ao meu target , à assembleia com quem comunico, às pessoas com quem eu falo.

Isto da sintonia, do discurso afinado, é essencial não só para ter sucesso mas para evitar tragédias, pois pode fazer a diferença entre a vida e a morte.

Não sei se viram há duas semanas a história de uma miúda holandesa de 19 anos em Espanha a fazer bungee jumping. Aparentemente tinha um treinador espanhol e como sabem os espanhóis falam línguas muito bem, terá dito " no jump ” que era para ela não saltar e ela percebeu "now jump” que quer dizer "salta agora”. Ela atirou-se e morreu.

A diferença da sintonia, estavam a falar uma língua que não era comum, pode fazer a diferença entre a vida e a morte.

 
Dr.Rodrigo Moita de Deus

Bom dia a todos.

Vamos pegar neste caso dos três elementos da comunicação e vamos analisar profundamente o recetor da mensagem. Este é o vosso recetor da mensagem, é um eleitor típico, certo?

Por quê o peixinho? O peixinho tem uma memória de três segundos e por isso vive feliz naquele boião porque passa às voltas e não se lembra que já tinha passado por lá antes. Portanto, tudo o que ele vê é sempre novo. Este é o eleitor típico.

Mas o recetor tem outra característica, o comportamento do eleitor é mais ou menos este: na prática, o eleitorado é como se fosse um grande rebanho de ovelhas, há umas que vão para a direita, outras para a esquerda e as ovelhas negras vão sempre para o Bloco de Esquerda.

Normalmente costuma ser assim.

[RISOS, APLAUSOS]

Não é brincadeira nenhuma. Imagino que seja mais divertido lá do que cá. De qualquer das maneiras, agora falando um pouco mais a sério, não muito mais a sério, queria apresentar-vos um senhor chamado Manuel Damásio.

É um cientista português com quem trabalhei na Fundação Champalimaud, é um neurocientista que fez uma série de descobertas sobre o funcionamento do cérebro humano, algumas das quais bastante úteis para a parte da comunicação.

Escreveu, aliás, um livro chamado "O Erro de Descartes”, que recomendo especialmente.

Uma das descobertas que foi feita nas neurociências é de que o cérebro funciona por compartimentos estanques, ou seja, sou capaz de desligar uma parte do cérebro e ter outras a funcionar ao mesmo tempo. Sou capaz perfeitamente de indicar aquilo que serve para as funções motoras, para falar, para comer, para sentir desejo e paixão, sentir emoções, por aí fora.

Dentro desses compartimentos conseguimos chegar a uma série de conclusões bastante úteis, uma das quais é que a memória visual é muito maior que a memória auditiva.

Isto quer dizer que vão ouvir-nos e mais facilmente vão lembrar-se da cor da minha camisa do que propriamente aquilo que eu disse. É mesmo assim, o eleitor funciona assim, as pessoas com quem interagem funcionam assim; a memória visual ser maior do que a auditiva significa que vão lembrar-se mais das imagens e por isso é que os outdoors em campanha são tão importantes do que propriamente os discursos que foram ditos.

Mas não é só, fizemos uma série de outras descobertas. Esta é uma espiral. Se ficarem a olhar para lá vão sentir aquela coisa extraordinária que nos seduz nas feiras que é a hipnose.

A hipnose tem nas neurociências um nome técnico que se chama zoning out. Na prática é quando um cérebro se habituou a uma determinada rotina, como lavar pratos e pô-los a secar, o cérebro desliga-se e começa a pensar noutras coisas.

O que é que isto tem a ver com Comunicação? Tem quase tudo a ver, porque se eu falar sempre com o mesmo tom de voz e estiver muito quieto o vosso cérebro vai ficar a pensar no almoço. O que vai acontecer no programa da tarde? Vão-se embora, deixam de aqui estar, ficam a olhar e a dizer que sim com a cabeça, que é aquilo que normalmente se faz nas aulas com professores especialmente chatos.

É ficar a dizer que sim com a cabeça e responder: "Sim, sim, claro”, como quando a nossa namorada nos apanha distraídos a pensar no Benfica, é o zoning out.

Mais importante ainda, é que o estímulo visual chega mais depressa à parte das emoções do que propriamente à parte da racionalidade do cérebro. Vejo qualquer coisa, a imagem vai para o meu cérebro e chega primeiro à parte da emoção e só depois chega à parte da racionalidade.

Isto quer dizer o quê? Voltamos ao "O Erro de Descartes”. É que eu sinto primeiro e só depois é que racionalizo o que estou a sentir. Isto quer dizer o quê traduzido em Comunicação? Quer dizer que quando eu me levantei as senhoras e senhores ou já gostavam de mim ou não gostavam e tudo aquilo que eu disser a partir daqui servirá para fundamentar o vosso preconceito.

"Ele é porreiro, é genial, as coisas que disse fazem todo o sentido”, ou "O gajo tem má pinta, eu sabia que ele era parvo”, na prática. Por isso é que as pessoas veem encarnado e acham que é do PCP e veem laranja acham que é do PSD, depois fazem raciocínios mais elaborados: se é laranja, do PSD, aquilo que ele quer é privatizar as coisas; se é encarnado, do PCP, quer é provocar alguma greve. Isto é a Política simplesmente.

Mas, se a memória só dá para três segundos têm muito cuidado com aquilo que fazem nesses três segundos. Trouxemos um vídeo exemplificativo de alguns atos heroicos e solenes em três segundos em formato de soundbites.

[VÍDEO]

A eloquência do Presidente Bush normalmente dava sempre para fazer estes sketches extraordinários. Aquilo que viram foi dois soundbites muito conhecidos e por quê? Não sei se conhecem a origem da palavra soundbite. Antigamente os filmes eram primeiro filmados e só depois eram gravados e escolhidos os sons melhores para acompanharem aqueles filmes, daí a expressão soundbite.

Mais importante ainda é terem a noção que o tempo de citação média de um político reduziu-se monumentalmente em televisão. Antigamente éramos capazes de passar um excerto com cerca de sete minutos de discurso como o que o Marco António fez aqui na Universidade de Verão no telejornal. Portanto, eles filmam ou dão em direto e depois fazem uma peça para o telejornal. O tempo de citação do Marco António há uns anos atrás seria de cinco ou oito minutos, enquanto ele a falar e não o jornalista a dizer que ele disse. O que é uma coisa extraordinária, não é? Temos jornalistas a explicar o que ele disse sem mostrarem o que ele disse. Não vale a pena, não é? Depois, perguntam-lhe a seguir o que é que ele quis dizer. O que é também uma coisa boa.

Mas o tempo de citação média reduziu-se tanto que na prática temos cerca de sete segundos. Ou seja, na prática, falamos cerca de meia hora e eles só ficam com sete segundos.

O que queremos na comunicação? Dar os melhores sete segundos que temos para oferecer.

Como é que fazemos, então, um soundbite ? Fazemo-lo pensando na mensagem que queremos transmitir e depois convertendo numa palavra, ou numa frase, com palavras simpáticas ou buzzwords favoráveis que é aquilo que vamos ver mais à frente.

Temos alguns exemplos de soundbites mais recentes: "pato Donald socialista”, "geração rasca”, "porcaria na ventoinha”, "que se lixem as eleições”, "para além da Troika” e "só em caso de invasão marciana” que é o caso mais recente do António Costa.

Queria que pensassem, de qualquer das maneiras, apesar da graça ou da não graça, que todos estes soundbites , todas estas frases, têm uma determinada mensagem. Todas elas se destinam a um determinado público e para passar de facto uma motivação política. Tudo isto é política, todos estes soundbites servem para afirmar qualquer coisa.

O problema do soundbite e das palavras favoráveis é que de vez em quando chocam na vontade do eleitor.

Trouxemos um vídeo já antigo de duas personagens que vocês são capazes de reconhecer: Tony Blair e David Cameron. Na altura ainda o Tony Blair era Primeiro-Ministro da Inglaterra e só depois o David Cameron Presidente da oposição.

[VÍDEO]

Não sei se reconhecem a palavra "change” que ficou muito famosa nos últimos anos e depois o Obama tratou de aplicá-la e em Portugal também terá sido usada há quatro anos atrás.

Perguntam vocês como é que é possível que o líder trabalhista e o líder conservador utilizem exatamente as mesmas palavras, os mesmos tiques, os mesmos gestos, os mesmos movimentos, sendo que eles eram oposição e liderança ao mesmo tempo.

É fácil: fazemos um focus group , juntamos 16 pessoas numa sala e elas dirão qual é a cor e tipo de gravata que preferem, se as camisas estão bem ou precisam de estar de outra maneira e quais são as palavras que gostam e não gostam. Aí temos palavras que temos favoráveis e as que não são: cool ou não cool , das que podemos utilizar e das que não podemos utilizar.

Trouxemo-vos alguns exemplos das que se podem usar: "novo” é uma das palavras que aprendemos em Publicidade que ao ser utilizada o produto passa a vender mais. Novo Skip versus velho Skip, toda a gente sabe que o novo Skip lava muito melhor e é muito mais eficaz. O Skip até pode ser o mesmo, a qualidade da roupa também, mas "novo” é sempre muito melhor.

Depois, há palavras que se podem usar em política que ficam sempre bem: "novo” é uma delas, "desenvolvimento” gostamos sempre e somos sempre favoráveis a ele, "emprego” está muito na moda também, "confiança” é bom, não esquecer, se dissermos muitas vezes confiança as pessoas acabam por confiar muito mais em nós.

"Investimento” é muito giro, porque o país precisa é de investimento para o desenvolvimento. "Crescimento”, "ambição”, "continuar” e por aí fora. Há palavras que de facto nos fazem despertar emoções positivas. Voltamos à questão da emoção versus racionalidade.

Depois, há palavras que não se podem utilizar de todo e vocês vão reparar nesta campanha se estiverem mais atentos aos discursos políticos. Uma delas é "dinheiro”, dinheiro é sujo, nunca utilizamos essa palavra. Utilizamos receitas, fundos, verbas, mas nunca falamos em dinheiro.

Somos tradicionalmente judaico-cristãos e portanto dinheiro é uma coisa suja, não tocamos em dinheiro, apesar de adorarmos dinheiro.

Obras, já ninguém promete, reparem. Por quê? Porque temos uma política hoje em dia de rigor e de cuidado com o défice. Por isso são palavras a não utilizar: défice, swap, PPP, troika, austeridade e a palavra final, mesmo proibida de todas, é "Gaspar”. Faz-nos lembrar sempre coisas horríveis que não queremos utilizar.

[RISOS]

A palavra mesmo, mesmo, proibida durante estas eleições todas? Vão reparar que ninguém vai utilizar: "prometo”. Ninguém pode prometer nada. Por quê? Porque as pessoas já não acreditam em promessas.

Qualquer pessoa que diga que promete, mesmo que seja bem-intencionada, há um dedo que se levanta, chama de mentiroso e que para estar a prometer é porque não traz coisa boa.

O melhor exemplo disso, é de facto este outdoor do António Costa e a promessa, que não era bem uma promessa, mas uma estimativa com base num plano, de que afinal podíamos criar milhares de empregos para revitalizar a economia e prometer o desenvolvimento.

 
Dep.Carlos Coelho

A segunda parte da nossa comunicação: contactos com a Comunicação Social. Têm de contactar com a Comunicação Social no exercício das vossas funções e a primeira coisa é perceber quem é o jornalista, quem é o vosso interlocutor.

No essencial, um jornalista é uma pessoa que tem um trabalho para realizar como qualquer um de nós; tem de contar uma história que seja interessante e atual. Não tem de compreender completamente aquilo que nós fazemos, mas precisa de alguma tensão, algum conflito, para alimentar a história. Precisa de um título, de uma buzzword , ou de um soundbite - como o Rodrigo referiu -, e pode precisar de um evento, isto é, de uma coisa gira para vender a história.

Há um caso concreto, de um ministro socialista, o Mário Lino, que a determinada altura disse que o aeroporto na margem sul jamais e referiu que aquilo era um deserto, não havia lá pessoas nem nada.

As pessoas da margem sul sentiram-se um bocado ofendidas com aquilo e houve algumas pessoas, em particular o nosso diretor-adjunto Nuno Matias que percebeu que havia ali uma oportunidade de caricaturar o ministro, que era gozar esta ideia de que na margem sul há um deserto.

Como é que em termos publicitários gozamos com um ministro a dizer que a margem sul não é um deserto? Há uma forma séria que era dizer para ir lá ver, que havia mais pessoas lá do que em Santarém, que o distrito de Setúbal é muito povoado. Há de certeza formas sérias de dizer que ele mentiu, que não era um deserto e estava cheio de pessoas, mais pessoas do que na maior parte dos sítios do país. Mas disso, qual é o jornalista que faz notícia? Não faz.

O que é que o Nuno Matias se lembrou? Se é um deserto, é importante ter um camelo. É uma forma indireta de chamar camelo ao ministro, portanto puseram aquilo. Ignorem o camelo real, vejam só o outdoor , é engraçado, mas não chega aos telejornais.

O que levou o outdoor aos telejornais foi o facto de eles terem tido a ideia genial de ir a um circo e alugar um camelo.

Portanto, não é só o outdoor onde está a mensagem política: "Na margem sul só conhecemos este camelo” que era o ministro, mas é a colocação do animal. Houve jornalistas que foram entrevistar o animal.

[RISOS]

Isto é um caso de uma forma gira de vender uma notícia e de marcar a nossa comunicação.

Cuidados a ter numa conferência de imprensa: de forma rápida, perguntem se é necessário ou não; não façam conferências de imprensa se não é necessário. Se os jornalistas vêm, a coisa mais ridícula que já me aconteceu na vida foi convocar uma conferência de imprensa e chegarem zero jornalistas. É uma coisa frustrante, posso garantir. Se já houve uma ontem, conferências de imprensa em cima de conferências de imprensa, banaliza-as e o jornalistas deixam de aparecer.

Escolher o dia e a hora sobretudo com a imprensa local e regional. Se todos os jornais saem à quinta-feira não é boa ideia fazer a conferência de imprensa à sexta-feira, porque as notícias se desatualizam uma semana até chegar outra vez a data de publicação.

Fazer uma convocatória à volta de quatro ou cinco dias antes, confirmarem na véspera para haver uma pressão, atenção ao tamanho da sala pois se a sala for muito grande e aparecerem três jornalistas dá assim um número esquisito. Se aparecerem 12 jornalistas e houver só seis cadeiras na sala têm o problema de que alguns ficarão em pé. Atenção à luz.

Muitas vezes há malta que acha que fica bem à frente da janela, com a janela aberta porque há uma paisagem bonita atrás, mas as fotos em contra-luz são uma tragédia.

Atenção ao décor. O que é o décor ? O décor é isto. Este é um colaborador da Universidade de Verão, que agora está no seminário e será um excelente padre, o António, a fazer uma comunicação aos jornalistas.

Agora, isto é o mesmo António com um décor. A impressão que deixa nos jornalistas é totalmente diferente, portanto vejam que quer para as fotografias, quer para a impressão que se lança sobre os agentes da Comunicação Social, é importante.

Outros cuidados: nas entrevistas, ver se há algo a dizer, porque se não há nada a dizer não deem a entrevista. A coisa mais ridícula é uma entrevista sem substância alguma. Alguns jornais não levam fotógrafo e é sempre bom ter fotografias daquilo que querem vender, sejam fotografias do protagonista, sejam da história que querem vender.

Na rádio, atenção, tenham voz firme, usem notas mas não leiam e usem pausas. Cuidado com o som que é algo fundamental.

Uma das coisas boas que temos na Universidade de Verão é o som. Recordo-me uma vez o Professor Cavaco Silva ter ido fazer uma coisa ao Solar do Vinho do Porto e o som não prestava. Quando ele pegava no microfone havia um ruído de feedback que assustava as pessoas todas e quando ele se afastava não se ouvia nada. Ele acabou por ter de prescindir do som. Estavam cerca de 250 pessoas, houve apenas umas 50 que perceberam aquilo que ele disse.

Portanto, um som de qualidade é essencial.

Atenção ao texto. Não vou desenvolver isso, pois têm na vossa documentação um exemplo do que é um comunicado e um tratamento de um comunicado com press release. O press release é um bocadinho como um prato. Imaginem o prato de que gostam mais. Se ele estiver mal apresentado não têm vontade de o comer e estiver bem apresentado já têm. A mesma coisa acontece com o texto. Se o texto for bem construído dá vontade de ler. Se for mal construído e mal apresentado, a malta mete-o no lixo e é um press release dedicado ao insucesso.

Em televisão usar roupa escura, evitar padrões, riscas, bolas, quadrados e inclinar o corpo ligeiramente para a câmara, aliás como nas fotografias. Nunca olhar diretamente para a câmara, olhar para o entrevistador e controlar o cenário, pois um cenário dinâmico tira a concentração do público e, portanto, ver se o cenário não é exagerado.

Nas senhoras não usar demasiadas joias, pois quando vão à televisão ser entrevistas a atenção é dedicada mais à joalharia do que propriamente ao protagonista. Relaxar e sorrir também é fundamental pois conquista simpatia.

Como falar com os jornalistas? Falar com os jornalistas não é falar para o jornalista, é falar com o público. O jornalista é um mediador, aquele que irá levar a nossa mensagem às pessoas, portanto não pensem que estão a falar para ele mas sim através dele e para detrás dele. Isso é essencial. Ser direto, claro e breve, sem exasperação e com classe.

Se houver perguntas difíceis tentar fugir às respostas evasivas porque traduzem fragilidades. Se o jornalista diz "O senhor andou a fazer gastos que não devia” e vocês respondem "Pois, sabe, agora que coloca essa questão…”, pronto, já estão enterrados.

Nas perguntas, podem fugir delas. Vamos supor que estou a falar com um jornalista na televisão e tenho uma mensagem para passar que é que o Rodrigo é um muito bom comunicador. O jornalista pergunta se o Dr. Rodrigo Moita de Deus vai à Universidade de Verão. Eu respondo que sim, que ele vai dar a aula do "Falar Claro” e que ele é um excelente comunicador.

O jornalista pergunta: "Não acha que a Ministra das Finanças devia ser mais rigorosa com o défice?”. Respondo: "Não, acho que as decisões que ela tem tomado sobre o défice estão boas, o problema dela é na comunicação, ela devia falar com o Rodrigo Moita de Deus, ele é um excelente comunicador.”

O jornalista diz: "Vamos mudar de assunto. Acha que há uma crise de vocações na Igreja?”. Eu respondo: "Acho que sim, hoje em dia é difícil ir para padre. Sabe, o problema da Igreja é um problema de comunicação; eles deviam falar com o Rodrigo Moita de Deus, ele é um excelente comunicador.”

O jornalista já desatinou e diz: "Então vamos falar de futebol. O senhor gosta mais do Messi ou do Ronaldo?”. Eu digo: "Eu acho que os dois são bons jogadores, mas gosto mais do Ronaldo. Sabe, o Ronaldo no futebol é para mim como o Rodrigo Moita de Deus na comunicação.”

[RISOS]

Esta é a maneira de eu ser fiel àquilo que quero. Numa comunicação com o jornalista, quero é passar a minha mensagem.

Há uma técnica que o Rodrigo mencionou que é a técnica do KISS, não exatamente a do beijo mas da expressão "keep it simple, stupid”, que hoje em dia os homens do Marketing traduzem de uma forma mais elegante para "keep it short and simple”. Ou seja, "mantenham isso curto e simples”.

O segredo de uma boa comunicação não é a elaboração sofisticada, mas sim a comunicação que é curta e simples para chegar a todos.

Vamos passar à terceira parte da comunicação com os novos meios.

 
Dr.Rodrigo Moita de Deus

Os novos meios e os próprios meios, porque na prática aquilo que queremos expor-vos é esta coisa extraordinária que continuamos muito dependentes do intermediário que é o jornalista para passarmos a nossa mensagem, quando hoje em dia há outras formas de o fazer.

Trouxe-vos algumas perguntas, talvez me possam ajudar nas respostas. Coloquem mesmo os braços no ar ou digam a resposta. Quantas pessoas estão na sala, alguém faz ideia? Aproximadamente 100.

Quantos de vocês é que se consideram cidadãos informados? Muito bem, só gente culta. Quantos é que têm Facebook, blogue, Twitter ou Instagram.

Isto há dez anos atrás era diferente. Pessoas informadas, expliquem-me lá, quantos de vocês é que viram ontem o telejornal das oito?

[RISOS]

Muito bem. O telejornal mais visto do país, aquele das oito, só um é que viu. O que é que você estava a fazer às oito da noite à frente da televisão? Muito bem.

Quantos ontem é que passaram pelo Facebook.

[RISOS]

Quantos é que estão agora online? Podem dizer, não é preciso terem medo do reitor que ele não faz queixa. Só? Não posso acreditar, a sério? Só vocês é que estão ligados? No telemóvel, vá lá?

[RISOS]

Ainda assim, partindo do princípio que 10% da sala está ligada. Vamos fazer uma média de duzentas pessoas a cada um. Quantas pessoas é que estão ligadas na realidade? Muito mais, porque vocês estão a emitir. Vocês são um emissor, ou, se quiserem, um Média.

Eu trouxe-vos um diagrama que pode ajudar a explicar mais ou menos como é que isto da comunicação dos meios funciona.

Na parte de cima têm aquilo que é paid media , ou seja tudo aquilo que é publicidade e espaço para comunicar e que é comunicação que eu pago. Como o exemplo dos outdoors , em que tenho de pagar para ter um.

Do vosso lado esquerdo, a propriedade dos próprios Média e do lado direito earned media que é aquilo que conseguimos de espaço nos jornais, via assessoria de imprensa, entrevistas e conferências de imprensa.

Depois, em baixo, social forum.

O que é que queremos dizer com isto? Queremos dizer que na realidade podemos criar meios. Se pensarem em vocês mesmos como meios de comunicação, porque o são, têm as vossas audiências no Twitter, no blogue, no Facebook. Têm uma audiência estabelecida, são um meio.

Estamos a falar da possibilidade que vocês têm de criar conteúdos para isso. Também vos falta criarem conteúdos para isso, seja vídeo que hoje em dia qualquer telemóvel dá que também tira fotografias, seja uma animação, um .gif, ou só uma fotografia, tudo isso é comunicação.

Tudo isto são vocês a aproveitar as novas tecnologias para fazerem delas o vosso próprio meio de Comunicação Social e de chegarem à vossa audiência e fazerem política com elas.

Quais são os problemas? Normalmente, olhamos para as redes sociais como uma extensão do que existe cá fora.

De vez em quando leio coisas extraordinárias do género que a Comissão Política Concelhia deliberou por unanimidade um voto de protesto ao Presidente da Câmara e entre outras coisas, tal e qual como se fosse um acto ou despacho da assembleia municipal, que é uma coisa que não faz sentido.

A primeira coisa a nunca se fazer nas redes sociais, ou nas nossas próprias plataformas: serem chatos. Não resulta. A política já por si é uma chatice, ponham isso na vossa cabeça. Depois fica uma enorme chatice pormos 5.000 pessoas que acham graça a isto, num universo de dez milhões.

É mesmo uma chatice, são tipos chatos, regra geral. Portanto, ser chato não resulta.

O segundo conselho é não usar siglas. Não vale a pena, pois tudo aquilo que são siglas não funciona. Mesmo as siglas partidárias. Os partidos assustam as pessoas, não as atraem e o que vocês querem é chegar a pessoas que queiram ser atraídas, portanto colocar siglas é afastar as pessoas.

Não vale a pena utilizar siglas, aquela coisa do PPD/PSD só isso é uma maçada para começarmos uma intervenção.

A terceira coisa que nunca devem fazer é insultar alguém; não vale a pena. A língua portuguesa é rica e permite-nos ridicularizar alguém sem ser necessário utilizar insultos. Podem ridicularizar alguém fazendo graças como o Nuno Matias fez com o camelo. Não precisou de chamar camelo ao ministro, não valia a pena, as pessoas perceberam, chegavam lá.

A quarta lição que é fundamental não só nas redes sociais, mas como em tudo na vida: ouvir mais do que aquilo que se fala. Tem a ver com a primeira, que é não ser chato.

Hoje em dia as tecnologias que temos à nossa disposição, sejam as redes sociais ou outras, são bidirecionais. Quer dizer que nós conseguimos dizer tanto quanto nos falarem, existe diálogo e é assim que se atrai as pessoas.

Não é com certeza chateando-as de morte durante meia hora.

A quinta lição: não pensar que o Mundo é só política. O Mundo não é só política. Como vos disse no princípio, o número de interessados em política é muito curto, não corresponde de todo ao vosso target , nem de perto nem de longe.

Portanto, as pessoas não são obrigadas a saber que o Bloco de Esquerda tem princípios marxistas-leninistas. Provavelmente nem precisam de saber.

Não precisam de saber que o PCP defende a saída de Portugal da NATO. Não é preciso.

O Mundo não ser só política significa que nós podemos ver o mundo de uma forma política sem utilizar todas aquelas expressões que fazem parte.

 
Dep.Carlos Coelho

Passamos à última fase da nossa comunicação, que são 15 conselhos para falar em público. Ou seja, responder à pergunta "o que é que eu tenho de fazer para falar bem em público”.

Quais são os 15 conselhos?

O primeiro é não ter medo do medo. Vamos ser claros: toda a gente teve medo pelo menos uma vez de falar em público.

A primeira vez que falei em público tremiam-me as pernas. Graças a deus foi na igreja e havia um púlpito em mármore muito largo e com exceção do padre que se rebolou a rir, ninguém assistiu ao meu embaraço.

Mas é normal ter medo e até é bom ter medo, porque a coisa pior na vida política é uma pessoa não ter noção do ridículo. O excesso de confiança pode ser dramático, porque podemos ceder à vaidade e portanto ter medo é uma espécie de vacina contra isso. Ter medo, algum receio, significa que temos de ter algum cuidado com o que fazemos e por isso pelo menos não cometemos o disparate de ter excesso de vaidade e portarmo-nos mal.

Há uma pessoa que não conhecem, eu também não conheci pois já tinha morrido quando eu nasci, que foi uma grande diva francesa que fez uma digressão nos Estados Unidos, chamada Sarah Bernhardt.

Uma história autêntica conta que num grande teatro, presumo que em Nova Iorque, antes de entrar em palco viu uma corista que também ia para o palco e quis ser simpática para ela - na altura havia uma grande diferença entre as grandes divas e o pessoal menor -, perguntando-lhe: "Então, minha menina está nervosa antes de entrar no palco?”. A outra empertigou-se toda, olhou para a grande Sarah e disse: "Ah, não, nunca estou nervosa nem tenho medo antes de entrar para o palco.”

A grande Sarah respondeu-lhe: "Pois bem, menina, há-de ter um dia quando tiver algum talento”. É esta a ideia de que o medo não significa ausência de talento mas sim perceção da responsabilidade daquilo que vamos fazer.

Na gestão do medo, há uma coisa essencial que é: o que fazer com as mãos. O nosso especialista em mãos é o Rodrigo Moita de Deus.

 
Dr.Rodrigo Moita de Deus

O corpo, para quem não sabe, produz uma coisa extraordinária chamada adrenalina, que é aquilo que normalmente nos dá a correr no sangue quando estamos a falar à frente das outras pessoas a falar.

Quem não sentir isso não é normal. Talvez o Professor Marcelo.

[RISOS]

Portanto, é normal sentirem essa adrenalina toda. Uma das coisas que o nosso cérebro faz é parar o nosso cérebro. Na prática, parece que levamos mais tempo a pensar e conseguimos até pensar naquilo que estamos a dizer, que é uma coisa que não existe no diálogo. É uma coisa extraordinária, porque estamos a falar com alguém, as palavras saem normalmente e quando vimos para aqui para cima do palco pensamos se estamos a usar a palavra certa enquanto estamos a falar. Conseguimos ouvir-nos a nós próprios, que é uma coisa extraordinária.

Outra coisa extraordinária é aquilo de descobrirmos as nossas próprias mãos. Estamos ali à frente do púlpito e de repente temos mãos que não estavam lá antes, cresceram quando saímos e fomos falar. A primeira tendência é agarrarmos o púlpito, não vá o púlpito fugir.

[RISOS]

A segunda tendência que é a dos mais vaidosos, é meter as mãos nos bolsos que é uma coisa que é sempre porreira, simpática, especialmente para quem nos está a ver falar.

As pessoas que têm estes mesmos tiques e têm de os trabalhar, utilizam alguns subterfúgios para esconder o nervosismo. A caneta é um ótimo tique que eu utilizo.

O Professor Marcelo, que é aquela pessoa que não é normal, vêem-no no telejornal e ele está sempre a brincar com o relógio. É uma coisa que toda a gente tem, o nervosismo. Ele agarrou o nervosismo e despachou-o para o relógio.

Há uma entrevista dele, aliás, que nós costumávamos passar aqui na Universidade de Verão, em que ele estava tão nervoso e tinha um papel à frente onde escreveu com a mão direita e com a esquerda. Era uma coisa extraordinária, tipo cantor pimba, mas versão escritor.

A melhor maneira de facto é arranjar um tique para disfarçar o vosso nervosismo e permitir uma descarga de adrenalina. A caneta é de facto uma vantagem. Há quem utilize os papéis na mão para se ir entretendo. O púlpito não deve ser agarrado, porque senão corre mesmo o risco de fugir, mas podem sempre agarrar com uma mãozinha.

Mas o importante mesmo é saberem dar uma ocupação às mãos que seja mais educada ou então vai acontecer-vos algo estranhíssimo. Como aconteceu na Assembleia aqui há uns anos, no caso de pessoas que não sabem o que fazer com as mãos.

 
Dep.Carlos Coelho

O segundo conselho é não atrair os abutres, ser firme. Tal como as moscas são atraídas pelo sangue, numa assembleia quem ataca é atraído pela fraqueza. É um pouco como na vida. Na natureza, quando os predadores atacam uma manada, atacam quem é mais frágil, quem aparenta ter mais dificuldade.

Os homens não são diferentes dos animais e, portanto, aquilo que têm de fazer é aparentar mais firmeza do que aquela que sentem e olhar de frente para a assembleia.

Há gente que diz não conseguem olhar de frente para a assembleia e que ficam muito nervosos. Há um truque que evita o pior, que é afunilar o vosso olhar para o papel e ignorar a assembleia. Isso é um corte. Imaginem que vos estou a falar e nunca olho para vocês, só olho para os meus papéis, cortei com a assembleia. Portanto, têm de olhar para a assembleia.

Se não conseguirem, o truque é o seguinte: olham para a última fila, veem quem está mais ou menos no meio. Imaginam que sou muito tímido e não consigo olhar para vocês. Percebi que a Carolina está no meio, imaginei um palmo acima da cabeça dela, portanto há um ponto fictício na parede e passo a olhá-lo, dando a ideia de que estou a olhar para a assembleia e por isso não estou a cortar o contacto.

O ideal é olhar para todos vós, mas se não conseguir fazer isso tenho o truque do ponto fictício.

A terceira recomendação é que não começarem a falar sem definirem o vosso intuito. É dizerem o que vocês querem com a vossa intervenção. Quero ser racional e despertar argumentos, emoções, enfim, o que quero com a minha intervenção.

Porque isso altera a estrutura da minha intervenção. Não tem que ver sobre o conteúdo pois isso é saber se vou falar de Agricultura, de nabos, de cenouras - que é um tema que me interessa muito como coelho -, ou se vou falar de obras públicas.

Portanto, a substância é diferente, mas o que me interessa é ver qual é o meu objetivo.

Isto não é só com as intervenções, mas com todos os instrumentos. Por exemplo, num pedido de esclarecimento, o que quero? Quero mesmo um pedido de esclarecimento, pois não percebi uma coisa, ou quero enervar ou irritar o adversário?

A maneira como construo o pedido e esclarecimento tem a ver com isto. Mesmo a forma mais limitada que é a resposta a um pedido de esclarecimento, o Rodrigo faz uma pergunta e eu tenho de responder. Mesmo essa figura que é mais bitolada, de estar a reagir a uma pergunta, posso usar para uma de três coisas: posso dar o esclarecimento e, portanto, respondo esclarecendo. Ou posso responder misturando alhos com bugalhos : "O que é que achas sobre o défice da Maria Luís?”. E eu respondo: "O problema da Maria Luís não é o défice é como comunica.” Portanto, estou a usar a pergunta para desviar a pergunta para outra matéria. Ou posso contra-atacar.

Logo, mesmo a resposta ao pedido de esclarecimento é um instrumento plástico, posso usá-lo para a comunicação conforme o que quiser.

Nunca se esqueçam, portanto, antes de falarem definam as vossas ideias-chaves, os vossos soundbites , qual é o vosso intuito e ordenem ideias e argumentos. Isso é o segredo de uma boa comunicação.

A quarta recomendação é não ignorar a audiência. Já falámos sobre isto no outro ponto. Discursar é comunicar, não é falar para, é falar com. Portanto, o ideal é vocês verem como as pessoas reagem. Estou a olhar para vocês a ver se estão a bocejar (reparei que estavam a bocejar quando o Rodrigo estava a falar) ou se estão atentos, interessados.

Isso é essencial para ajustarmos a nossa comunicação.

Quinta recomendação: não esquecer que os outros vêem o discurso, não o ouvem apenas. Com a exceção da rádio em que só se ouve o discurso, o discurso não se ouve apenas, vê-se. Por isso, há que representar o discurso, transmitir emoções, argumentos com emoção e falar com o corpo, no bom sentido da palavra, mas cuidado em não apalhaçar. Não posso dar aqui uns toques e dar chapadas no microfone, que já fica mal e cuidado com os tiques. Os tiques são dramáticos porque se houver muitos as pessoas fixam-se é neles.

Há uma pessoa que podia ser candidato do PS para Presidente da República, que atualmente tem um cargo nas Nações Unidas e foi Primeiro-Ministro de Portugal, que tinha um tique. Quando ele ia à televisão ninguém ouvia já o que ele falava porque estavam todos à espera que António Guterres ajeitasse a melena. Era uma coisa fantástica, não demorava um minuto que ele não voltasse a acertar o cabelo.

Eu não tenho esse risco, como é evidente.

[RISOS]

Não se esqueçam que um gesto vale mil palavras, para o bem e para o mal. Isso é importante quando se fala.

Tenham atenção à vossa imagem; as pessoas só votam em quem confiam.

 
Dr.Rodrigo Moita de Deus

O meu avô tinha uma frase muito engraçada em que me dizia: "Filho, se vais ao banco pedir dinheiro emprestado veste o teu melhor fato” e isso tinha uma razão de ser, não é?

Se eu fosse para lá com um fato todo roto provavelmente olhavam para mim e diziam que eu não tinha maneira de pagar aquilo que ia lá pedir emprestado e, portanto, não me iam emprestar dinheiro de todo.

O Vale e Azevedo também ouviu essa frase e foi abusando excessivamente desse preceito. A verdade é que a maneira como nós nos apresentamos em público transmite ou não confiança e esta é quase tudo para garantir que as pessoas votem em nós.

Na prática, o que estamos a pedir quando pedimos um voto é que as pessoas confiem em nós o seu dinheiro, quanto mais não seja o dinheiro dos impostos que vamos pagando.

Queria dar-vos um exemplo bastante mais prático. Não sei se conseguem reconhecer este senhor. Na altura tinha um ar presidiário, é capaz de voltar a ter, mais cedo do que as pessoas pensam.

[RISOS]

Mas, isto, foi assim que ele se apresentou a votos três ou quatro vezes no Brasil pelo Partido Trabalhista com este ar de senhor confiável de quem ia para fazer o bem à comunidade. Depois, apresentou-se de outra maneira, numas eleições mais à frente vejam a transformação para 2004. Cá está, um senhor de barba aparada, um fatinho, um pin na lapela, parece um chefe de Estado e não um gangster sindicalista. Parece uma coisa completamente diferente.

As pessoas, de facto, só votam em quem confiam. Transmitir confiança às pessoas é um trabalho nosso que temos de ser nós a fazer.

 
Dep.Carlos Coelho

Sétimo conselho: não falem sem sentirem o que dizem. As pessoas sentem quando vocês falam com autenticidade, quando falam da vossa experiência, daquilo que sabem, daquilo que gostam e desejam.

Ou quando falam com algum grau de falsidade. Portanto, a ideia é falarem de certa forma com o coração.

Têm na vossa pasta algo fantástico que é uma tabela com frases, é o último documento. Se juntarem uma frase da coluna A com uma da coluna B mais uma da coluna C e da coluna D, constroem frases fantásticas.

Por exemplo, a frase seguinte: "o incentivo ao avanço tecnológico, assim como o desenvolvimento de formas distintas de atuação, oferece uma oportunidade de verificação das condições apropriadas para os negócios”. Isto soa bem, mas o que é que eu disse? Não disse nada.

Podem divertir-se, quando não tiverem mais nada para fazer, a criar estas combinações. Dizem que são dez mil combinações, frases e variações. Dez mil frases que soam bem mas não dizem nada. Dez mil formas de não dizerem nada, de não convencerem ninguém e de soarem a falso.

Não vale a pena tentar usar palavras sofisticadas ou frases compridas, o que interessa é falar com autenticidade. É isso que faz a diferença na comunicação.

A oitava recomendação é que ganhem a simpatia do público. Na primeira intervenção, às vezes, as pessoas tendem a querer falar caro para provarem que são muito boas. Acho que entre parecer convencido ou modesto e simpático, é melhor parecer modesto e simpático na primeira impressão.

Diz-se em português que não há uma segunda oportunidade para causar uma primeira boa impressão. A primeira impressão deve ser uma marca de simpatia e de afabilidade, sobretudo quando se é jovem.

Não quero que sejam demasiado humildes ou simplórios, mas podem ser modestos.

Isto é um exemplo que o Rodrigo fez para nós há dez anos, tentando simular o embaraço de um jovem que chega ao poder num órgão autárquico ou na Assembleia da República e que faz a sua primeira intervenção.

[VÍDEO]

Ele engasgou-se, não disse nada, mas transmitiu uma imagem de simpatia. É melhor ser recebido com simpatia do que ser recebido com hostilidade. Não há uma segunda oportunidade para causar uma primeira boa impressão.

O nono conselho é que não sejam chatos, não sejam como eu e o Rodrigo que estamos aqui a falar há tempo demais. O ideal é nunca falarem mais de 20 minutos numa intervenção de fundo, não falar demais.

Cuidado que quando se fala sem papel uma pessoa perde a noção do tempo e não falem depressa demais.

Imaginem o que é o Paulo Colaço, quando fez ontem aquela leitura fantástica da "Carta a meus filhos sobre os fuzilamentos de Goya”, eu dizer-lhe que ele tem de encurtá-la e ele em vez de encurtar o texto resolvia acelerar ao ler. Não dá. Vocês podem dizer que isso não acontece, mas acontece. Assisti a um deputado na Assembleia da República passar por essa cena pateta. O Presidente disse que o senhor deputado tinha mais um minuto, ele olhou e em vez de passar para o último parágrafo e terminar a intervenção em beleza com uma punchline , decidiu acelerar o texto. Ele leu o texto e toda a gente riu, destruindo-se assim qualquer eficácia na sua comunicação.

Mas, para além disso, não se esqueçam de uma coisa fundamental das que queria que recordassem da nossa conversa: é que a comunicação não é um concurso de elegância mas é um concurso de eficácia.

Ou seja, não têm de aparecer como os gajos mais cultos e mais sofisticados, mas têm de aparecer como os que chegam às pessoas que interessam. Portanto, tudo o que é um discurso elaborado é vosso inimigo e recusem o discurso redondo.

O que é o discurso redondo? Pedimos ao Gonçalo Capitão, que foi nosso deputado da JSD na Assembleia da República, para simular um discurso redondo. Ele fez este discurso.

[VÍDEO]

O que é que ele disse? Isto escrito é elegante, mas o que é que ele disse, qual foi a mensagem que ele passou e o que é que as pessoas perceberam do que ele disse?

Teria ganho muito mais se tivesse falado concretamente e teria sido isto que ele disse.

[VÍDEO]

É isto que ele queria dizer. Qual é a comparação? Ele falou de uma forma muito sofisticada, muito redonda e elaborada e ninguém percebeu nada.

Não se esqueçam que a comunicação não é um concurso de elegância mas um concurso de eficácia.

A décima recomendação é nunca decorarem um discurso escrito, pois as linguagem são diferentes e pode acontecer um bloqueio psicológico. Um dos maiores oradores de sempre da História parlamentar britânica, Sir Winston Churchill fez isso uma vez. Decorou um discurso, perdeu-se a meio, teve de se sentar envergonhado.

Se vão falar de improviso, organizem o vosso discurso num cartão e portanto se se perderem num cartão passam para o seguinte. Se querem ler um texto, não o decorem, leiam-no pois ler um bom texto é uma boa forma de comunicar.

Cuidado quando se pede a alguém para escrever. Todos nós na nossa vida já pedimos a um amigo para nos ajudar a escrever um texto. Não há problema nenhum, mas têm é de adaptar o texto a vocês. O pior que pode acontecer é irem para uma cerimónia com um discurso que não foi feito por vocês e tropeçarem nas palavras, não estar adaptado ao vosso ritmo, ou não conseguirem sequer perceber o que a pessoa que escreveu o texto queria que vocês dissessem.

A 11ª recomendação é nunca descurarem as defesas. Quando fazem uma intervenção de fundo, às vezes, temos o ataque - sobretudo quando se é jovem - de que nada do que dissemos se aproveita. Ora, se queremos evitar esse ataque, temos de meter num discurso de fundo alguns princípios gerais que toda a gente subscreva.

Se houver alguém com maldade que diga que nada do que dissemos se aproveita, podemos retorquir e perguntar se não concorda com isto ou aquilo, embaraçando quem nos ataca, porque incluímos grandes princípios que todos têm de subscrever.

Ganhar o consenso na comunicação, pois duvido que alguém não concorde que não há solidariedade sem reduzir as diferenças gritantes entre os cidadãos, ou que não há progresso justo em Portugal sem que ele se faça sentir em todas as regiões do país. Duvido que alguém discorde que reduzir as assimetrias do desenvolvimento entre o Litoral e o Interior, o Norte e o Sul, a cidade e o campo, deve ser uma prioridade do desenvolvimento do país.

A informação, a participação dos cidadãos, a qualidade de vida, o ambiente, o bem-estar, a transparência na administração, são aquelas cool words , palavras e conceitos bons, que o Rodrigo falava há pouco que ficam bem num discurso.

A 12ª recomendação é que é melhor responder que não se sabe do que simular conhecimento. A pior coisa é fingirmos que sabemos alguma coisa e depois sermos desmascarados. Fazerem-nos uma pergunta, dizermos que sabemos a resposta e depois não acertarmos. Não interessa o nome, mas uma senhora muito importante na vida política portuguesa recebeu uma vez uma pessoa que era muito importante no Parlamento Europeu. A senhora não sabia nada sobre a Europa. Ele dizia que devíamos promover conferências, apresentar melhor o pensamento de Jean Monet e a senhora com a maior candura disse: "Ah, senhor deputado, mas isso é uma excelente ideia, o senhor está lá em Bruxelas pode até convidar o senhor Monet a vir a Portugal.”

[RISOS]

Era um bocadinho difícil ressuscitá-lo. Foi o disparate total. Perceberam que a senhora não sabia nada do que estava a falar, estava num debate para o qual não estava minimamente preparada.

Se for confrontado com uma situação que não conheço, na rádio ou na televisão, em vez de simular conhecimento e ser apanhado na curva, é melhor jogar para o lado.

Dizer, por exemplo: "Nunca tinha visto o problema por esse ângulo”, ou "Parece-me interessante, talvez perigoso, mas gostaria de pensar melhor antes de me pronunciar”, ou "Prefiro não responder já, quero fazer-lhe justiça e acho que o seu argumento merece ser ponderado”. Tratar bem o interlocutor mas não responder imediatamente, dizendo: "Evocou argumentos novos que merecem reflexão e se reagisse de imediato não lhe faria justiça.”

É melhor do que simular conhecimento.

 
Dr.Rodrigo Moita de Deus

Há pouco falávamos em como não sabemos o que responder, porque em Portugal normalmente as perguntas são sempre maliciosas e ninguém gosta de mostrar ignorância. Portanto, quando alguém da oposição nos pergunta alguma coisa é porque nos quer entalar e mais nada, vamos ser sinceros.

Estamos num debate e a oposição pergunta qualquer coisa - é de certeza para nos entalar, não é para saber, pois se quisesse informação tinha enviado um requerimento ou algo do género.

Por isso, a mesma coisa para os jornalistas.

Qual é a técnica que trabalhamos: bloqueio/ponte, que na prática é primeiro bloqueamos o intuito da pergunta e depois fazemos a ponte para o tema e mensagem que nos interessam passar.

É aquela brincadeira que o Carlos fez há pouco que era para valorizar que o Rodrigo é que é um excelente comunicador - e já agora aproveito para dizer que é mesmo verdade.

[RISOS]

Essa brincadeira que ele fez é exatamente isso de bloquear a pergunta e fazer a ponte para aquilo que nos interessa.

Normalmente quando ouvem um político na televisão dizer "ainda bem que me faz essa pergunta”, é porque ele não vai responder, é um bloqueio e o princípio da ponte para ele dar a resposta que lhe interessa que é dizer que o Rodrigo é um excelente comunicador. Primeiro bloqueamos a pergunta, fugindo de alguma forma como este exemplo que utilizamos de dizer que ficamos felizes de terem feito essa pergunta e depois fazemos a ponte para a mensagem que nos interessa passar, porque nós temos de estar sempre focados na mensagem que queremos passar para as pessoas e tudo o resto não interessa para nada; "o que é importante lembrar é que o Rodrigo é um excelente comunicador”.

 
Dep.Carlos Coelho

A 13ª recomendação é atacar com firmeza, protegendo a retaguarda. Imaginem que há um escândalo com um presidente da câmara socialista, ou com um presidente de junta. O Rafael conhece um que constava, aparentemente com razão, mas na altura não havia muitas provas que roubava dinheiro, ou fazia assédio sexual sobre as funcionárias da junta, que é uma coisa detestável.

Nós não podemos afirmar nada de que não temos provas, mas às vezes temos de usar o argumento, porque está na praça pública. Como é que uma pessoa faz isso? É o "parece-nos que”.

Por exemplo, posso usar esta formulação, imaginem numa assembleia municipal ou de freguesia: "A confirmarem-se os rumores que correm, temos de apurar responsabilidades e retirar consequências jurídicas e políticas”. Reparem na riqueza do português. Se eu em vez de dizer "retirar consequências jurídicas e políticas”, "retirar consequências políticas e criminais”, tem mais acinte.

Outra formulação: "Estamos preocupados com as informações que circulam, que a confirmarem-se são prova da mais grave irresponsabilidade e do aproveitamento ilícito de recursos públicos”. Está lá o ataque "prova da mais grave irresponsabilidade e do aproveitamento ilícito de recursos públicos”, mas "a confirmarem-se”, não estamos a dizer que estão dadas como confirmadas. Ou ainda, "boatos com esta gravidade têm de ser desmentidos sob pena de minarem a credibilidade de autarcas que até prova em contrário devem merecer a nossa consideração”; esta é de uma fineza irónica fantástica.

Portanto, ataquem com firmeza mas protejam a retaguarda.

A penúltima recomendação é nunca atacarem com maldade, doseiem a vossa agressividade. Devem evitar ataques pessoais, insinuar com fundamento e com clareza e, se forem atacados, representar a indignação.

Ou seja, não se deixem ficar.

Temos vários exemplos mas para não tomar muito tempo vamos só mostrar o do PCP. Pedimos ao Gonçalo Capitão que simulasse um ataque do PC ao nosso deputado e ele devolveu o ataque, acusando o PC daquilo que põe um comunista qualquer furioso, diz que eles são como os fascistas, mas de uma forma elegante.

[VÍDEO]

É uma forma de defesa da honra, dizer que eles estavam a fazer exatamente o que criticavam aos fascistas e, portanto, deixar qualquer comunista com fumo a sair-lhe das orelhas com este tipo de ataque. Isto é quando nos defendemos.

Quando atacamos, devemos ser "filhos da mãe” educadinhos. Dois exemplos com o Gonçalo Capitão e o Rodrigo Moita de Deus.

[VÍDEO]

Serem "filhos da mãe” educadinhos é uma forma de atacarem sem correrem o risco de falta de educação.

A última recomendação é nunca admitam serem inferiorizados por razões de idade, sexo ou cor. Não há nenhum fator de discriminação que seja aceitável. Qualquer fator de discriminação é reprovável e devem recorrer à defesa da honra. O Gonçalo Capitão gravou uma defesa da honra por alguém na Assembleia o acusar ser demasiado jovem e ele fez esta defesa da honra.

[VÍDEO, RISOS]

Passámos este vídeo há uns seis anos e tínhamos uma colega vossa da zona de Lisboa, negra, que disse: "Muito bem, isso é muito giro. Agora imagine alguém como eu, que sou jovem, sou mulher e negra”. Portanto, uma tripla discriminação e ela perguntou como é que se podia defender.

É uma coisa que eu nunca tinha pensado e que pensei isso muito bem. Se ela tiver sangue-frio o ideal é atacar quem tentou discriminar exatamente com as mesmas armas. Isto é, um fulano que não aceita jovens, mulheres, negros, é um machista horroroso mal-educado.

Portanto, se ela tiver sangue-frio poderá dizer: "Vejo-o nervoso, agressivo e precipitado, não sei o que o perturba mais” - dizer a um homem que ele está perturbado é atacar a masculinidade dele - "se o facto de ser jovem, ser mulher, ou ser preta”, pondo as coisas todas em cima da mesa. "Qualquer dos receios só por si já o deveria embaraçar, concentre-se no que aqui afirmei e na razão que me assiste, tudo mais é preconceito que o deveria envergonhar” e se ela tivesse sangue-frio para fazer esta reação seria bingo, 20 valores numa escala de zero a 20.

Porque era pôr o provocador no sítio com elegância, mas também com contundência. Não se esqueçam nunca que o sangue-frio valoriza a reação e valoriza o disparate. O que não podem é reagir com a cabeça quente, pois dá para o disparate, para a acusação mútua e a determinada altura são gritos de parte a parte.

Muito bem, vamos terminar. Nesta aula do "Falar Claro” tentámos passar-vos a imagem de que a comunicação é essencial na política e pode-se comunicar com palavras, gestos e atitudes. Em bom rigor, por estranho que possa parecer numa aula sobre "Falar Claro”, nós podemos comunicar sem falar.

Uma amiga minha disse-me, uma vez, que as mais lindas frases de amor são ditas no silêncio de um olhar. Se ela tem razão, não precisamos de falar para comunicar, mas é indiscutível que precisamos de comunicar bem.

Muito obrigado.

 
Simão Ribeiro
Passo agora palavra para a nossa plateia e começo pelo Ricardo Pinto, do Grupo Cinzento.
 
Ricardo Pinto

Muito bom dia. Primeiro gostava de cumprimentar o Dr. Carlos Coelho, o Dr. Simão Ribeiro, o Dr. Rodrigo Moita de Deus e o Dr. Nuno Matias, bem como os meus colegas e agradecer a oportunidade que nos foi concedida de estar aqui presentes.

O tema "Falar Claro”, claro por si fala, mas colocou-nos de certa parte uma dúvida no primeiro ponto. Pode parecer um bocado brejeira, comum, mas que acho muito importante no exercício da política.

Sá Carneiro terá dito em 1972: "O que não posso, porque não tenho esse direito, é calar-me seja sob que pretexto for”, o que indica a necessidade que um político tem de comunicar e que é um ponto nevrálgico.

Portanto, perante uma pergunta de índole ofensiva por parte de um jornalista qual deverá ser a nossa atitude, a nossa estratégia, a adotar?

Quase se vive uma crise de valores, em que tudo serve para alimentar a informação, quanto mais não seja o botox utilizado pela Manuela Moura Guedes.

Então, gostava de poder ver esta dúvida esclarecida. Obrigado.

 
Simão Ribeiro

Obrigado, Ricardo. Deixem-me só dar uma nota que julgo que já ontem foi dito ontem pelos coordenadores dos grupos, mas eu queria salientá-lo também. Não sejam formais na maneira abordam os nossos oradores, sejam eles quem forem, nomeadamente quando fazem as vossas questões.

Escusam de cumprimentar as pessoas que estão aqui. Não é má educação, mas façam a pergunta diretamente, está bem? Que é para pouparmos tempo para os nossos colegas.

Outra coisa: os microfones, sei que é natural não conhecerem o material, mas podem falar com eles a esta distância, de forma completamente natural, como se eles não existissem, porque nós ouvimos na mesma.

Até já.

 
Dep.Carlos Coelho

Muito bem. Ricardo, é tudo uma questão de limites. Presumo que goste de comer, não sei se gosta de pôr mais sal ou mais açúcar, mas eu não gosto de comida sem sal, embora todos me digam que ponho sal a mais e se calhar estou a fazer uma comida muito salgada. Mas se a comida estiver muito salgada não gosto. Portanto, há sempre um limite.

Se tiver um jornalista à frente que me faça uma pergunta que acho inoportuna, uso a estratégia de vender aquilo que quero.

Ele diz "ah, o senhor dormiu no Parlamento Europeu” e eu respondo que no Parlamento Europeu aquilo que faço é sobretudo acompanhar o Juncker e neste momento a nossa prioridade é investimento e emprego. O jornalista insiste em repetir sobre eu ter dormido no Parlamento Europeu e eu aí digo: "As suas informações não estão corretas. Eu não confundo a minha cama. Mas o que eu quero sobretudo no Parlamento Europeu é assegurar que há uma resposta eficaz europeia a esta tragédia dos imigrantes que estão a morrer no Mediterrâneo.”

Se o jornalista ultrapassar os limites da decência e for verdadeiramente insultuoso digo: "Desculpe, isso já não é a atitude de um jornalista. O senhor não é meu adversário, não está aqui para me fazer acusações e eu não estou aqui para ser insultado e, portanto, acabou aqui a nossa conversa.”

Isso é uma atitude de rutura para casos "limite”. Encontrar os limites virtuosos depende de cada caso. Não sei se o Rodrigo quer acrescentar alguma coisa.

 
Dr.Rodrigo Moita de Deus

Só queria acrescentar uma coisa, Ricardo: é muito perigoso para quem anda nesta vida o espírito de a Comunicação Social ser má. Porque é um discurso que nós já ouvimos há 11 anos aqui na Universidade de Verão e já na altura a Comunicação Social era vista como má. Se for perguntar ao PS ele diz exatamente a mesma coisa.

Parece um bocado aquela conversa dos comentadores. "Os jornalistas e comentadores são todos do PSD”, dizem eles e nós dizemos que são todos do PS. Queixamo-nos do árbitro. Um jornalista, na prática, é isso, é um árbitro, mediador da relação que temos com o público. Portanto, perder muito tempo com o jornalista é má estratégia eleitoral/profissional, porque ele é um intermediário.

Não vale a pena enervamo-nos com o árbitro, reclamarmos ou dizermos que o jogo está comprado.

Isso parece discurso da malta do Sporting. Gosto é do Benfica, certinho como o destino, ninguém se queixa cá do árbitro.

Isto para dizer o seguinte: a resposta boa como o Carlos estava a comentar, é perguntar se o jornalista quer marcar um debate e qual é o partido de que ele vem. É mais simples.

 
Simão Ribeiro
Muito bem. Maria João Magalhães, do Grupo Bege.
 
Maria João Magalhães

Muito bom dia.

Falar claro significa que o emissor da mensagem, quem fala, consegue fazer passar a mensagem de forma tão eficaz que o ouvinte não fica com dúvidas na mensagem que acabou de ouvir.

Se falar claro é importante então por que são os políticos mais conhecidos pelo uso da retórica do que pela forma que passam a própria mensagem?

 
Dr.Rodrigo Moita de Deus

Eles não são famosos pelo uso da retórica, eles são é chatos.

Eu tenho para mim uma teoria que vou partilhar convosco, mesmo correndo o risco de ofender alguns presentes.

O problema é de Coimbra e da Universidade de Coimbra, e desta nossa coisa extraordinária que metemos na cabeça de que um professor é tanto ou mais inteligente quanto mais complicado ele for. O bom professor, pelo menos na Faculdade de Direito de Lisboa, era aquele que tinha uma alta percentagem de chumbos. "Só há dois que passam!” e nós achamos que aquilo é um bom professor. Eu cá acho que ele é um incompetente, um tipo que não sabe aproveitar as aulas para passar conhecimento.

Isto tem muito que ver com o objetivo da comunicação e com uma coisa que o Carlos Coelho chamou muito à atenção: o objetivo da comunicação é ser eficaz, não é parecermos bem nas fotografias, nem parecermos bonitos. Nalguns casos é mais fácil do que noutros, no meu caso é muito mais fácil do que no do Carlos.

Devemos ser eficazes a passar a nossa mensagem e a comunicação deve medir-se por isso, pela eficácia e pelos resultados. Tudo o resto que você vê na Assembleia da República é a explicação das fracas audiências e do fraco interesse que as pessoas têm pela política: são os deputados a falarem uns para os outros.

Olha para a Assembleia da República, está tudo de fato cinzento, tirando o Nuno Matias e o João Galamba, não obrigatoriamente pelas mesmas razões, e falam uns para os outros naquele universo fechado, em vez de perceberem que estão ali para falarem às pessoas que estão lá fora.

Você chama isso de oratória? Não. Retórica? Também não. Na prática, é aquele exercício de vaidade ou de excesso de confiança, uma "egotrip”, em bom rigor.

 
Simão Ribeiro

Muito bem, obrigado Rodrigo pela parte que me toca. [RISOS]

De seguida, Soraia Lopes, do Grupo Rosa.

 
Soraia Lopes
Bom dia a todos. Uma das grandes causas do afastamento e repugnância das pessoas pela política é de certo modo a falta de clareza e exposição de temas políticos. Perante este facto, o Grupo Rosa interroga: como podemos ter uma linguagem mais clara de forma a chegar ao entendimento das pessoas e assim promover o interesse político?
 
Dep.Carlos Coelho

Só depende da nossa vontade. O conceito aqui é a democratização da comunicação. Vamos supor que quero obter uma condecoração ou uma distinção académica como o Prémio Nobel, por isso tenho de convencer um conjunto de pessoas, cientistas, neurocientistas como o colega Damásio aqui do Rodrigo.

Junto-os e faço uma comunicação para eles. Se estou no jogo democrático, não estou a falar para uma elite, estou a falar para todos, portanto, tenho de democratizar a minha comunicação. Mesmo correndo o risco de nalguns casos ela ser básica demais para alguns, mas chega a todos. Portanto, é um problema de vontade.

A sua pergunta liga-se com a pergunta que a Maria João fez há pouco. Porque é que os políticos fazem discursos muito elaborados? Porque não têm isto e cedem à vaidade. Acontece a muitos de nós e não estou a pôr-me fora disso.

Na primeira vez que falei na Assembleia, se calhar pensei em fazer um discurso elegante, quis que os meus pares olhassem para mim e dissessem que eu era bom, "este puto sabe falar e tem conceitos muito sofisticados”. Está bem, mas depois o que é que lá fora dá? Dá zero. É aquele discurso redondo do Gonçalo, em que queria dizer que mais de metade dos eleitores tinham menos de 30 anos e fez uma coisa tão construída que ninguém percebeu o que ele estava a dizer.

O conceito aqui é a democratização da informação. Se em Democracia queremos que todos nos percebam, temos de nivelar um pouco por baixo. Não estou a falar nos argumentos, não estou a dizer que temos de fazer política populista pois isso é uma descaracterização de um político sério, mas estou a dizer na forma de comunicar, nos instrumentos de comunicação.

Se for falar para um conjunto de meninos de seis anos numa escola, como por exemplo eu tive de dar uma aula de Europa, não fui fazer a mesma coisa de quando falei na Faculdade de Direito de Lisboa, como é evidente. As metáforas, as linguagens e os exemplos são outros, porque adaptamos ao nosso target.

É isso que temos de fazer: adaptar ao nosso target e na comunicação democrática tentar apanhar o maior número de pessoas, mesmo baixando o nível da comunicação.

 
Simão Ribeiro
Tem agora a palavra o José Manuel Ribeiro, do Grupo Azul.
 
José Manuel Ribeiro
Muito bom dia, deputado Carlos Coelho. Num mundo cada vez mais desenvolvido, onde a informação e a contra-informação caminham de mãos dadas, quais as principais medidas que um orador deve adotar de forma a minimizar as hipóteses de distorção da mensagem?
 
Dep.Carlos Coelho

É curioso que as vossas perguntas estão todas alinhadas com a mesma preocupação. A melhor forma de impedir a distorção da mensagem é ser claro. Se eu tiver um discurso equívoco, ou porque muito redondo ou porque muito subjetivo, como por exemplo, perguntam "Gostas mais do Simão ou do Nuno?” e a minha resposta "Bem, os dois têm muitas valências, são dois grandes quadros da JSD, deputados de exceção; é verdade que o Simão é mais do Norte e gosta mais de crocodilos, que o Nuno Matias é mais de Setúbal e gosta mais de camelos”, ou seja, ando aqui a enrolar, o que é que o jornalista vai dizer? Que o Carlos Coelho insinuou que o Nuno Matias era um camelo e que o Simão era um crocodilo.

Por quê? Porque a minha resposta não era clara, não havia uma mensagem forte e não havendo dá espaço para toda a interpretação. A única forma de impedirmos as más interpretações é sermos claros: é aquilo que queremos dizer, é aquilo que dizemos. É a melhor forma de evitar as distorções na comunicação.

[RISOS]

 
Simão Ribeiro
Tem agora a palavra a Carlota Vieira, do Grupo Amarelo.
 

Bom dia. A minha questão é mais dirigida a Carlos Coelho.

Queria perguntar que tipo de estratégias poderá ser utilizado para que pessoas mais inibidas possam comunicar de forma mais eficaz e segura.

 
Dep.Carlos Coelho

Carlota, muito obrigado, é uma excelente pergunta.

Tivemos aqui uma pessoa fantástica que não chegaram a conhecer, que é a Susana Correia Santos, que foi a responsável do apoio em várias Universidades de Verão e noutros eventos. Ela é uma investigadora, doutorada em Psicologia, e que não está connosco porque está nos EUA onde está a dirigir um projeto de investigação. Temos falado com ela.

A Susana que é uma professora fantástica e investigadora de exceção, tem um problema de gaguez nalguns momentos. Praticamente, na primeira vez que a conheci, percebi logo que havia um problema de gaguez mas a pessoa é elegante e não diz "tu és gaga”. Ela virou-se para mim e disse: "Sabe qual é a minha cantora preferida? É a Lady Gaga” e eu ri-me. Os amigos dela conhecem esta anedota. É a forma de ela viver com isto, para ela não é um problema. Aquilo é muito irregular, umas vezes acontece mais.

Não vai acreditar naquilo que lhe vou dizer, Carlota, mas é sincero. É difícil conhecer uma pessoa mais tímida que eu. Sei que não vai acreditar, mas é realmente difícil encontrar uma pessoa mais tímida do que eu. Tive é de ultrapassar a timidez. Não era capaz de falar em público.

Até hoje em dia tenho alguma incomodidade em ambientes que não conheço. Em ambientes que conheço não tenho problemas nenhuns, mas vou de repente para um ambiente que não conheço e não me sinto seguro, não me sinto confortável.

Temos todos de viver com as nossas insuficiências. Todos gostaríamos de ter alguma coisa que não temos. Eu gostava de ser mais alto, de falar tão bem como o Rodrigo, de ser tão assertivo quanto o Nuno, ter muitos dos talentos do Simão e talvez a idade dele. Mas somos nós e é a nossa realidade que ninguém nos rouba, portanto, temos de viver com a nossa individualidade e ver como tiramos partido dela.

Agora, a melhor coisa é não nos deixarmos acabrunhar por uma fragilidade.

Uma vez estava eu na JSD e íamos quatro jagunços num carro. Um deles, lá de trás, mandou uma boca sobre os carecas e eu virei-me para trás e disse: "É muito desagradável da vossa parte estarem com piadas, sabem que tenho imenso complexo em ser careca e isso é tremendamente desagradável”. Criou-se um silêncio no carro, vocês não fazem ideia.

Até que há um deles, que me conhecia melhor, que desata a rir e a malta percebeu que eu estava a brincar. Mas, há malta que não tem cabelo e que tem imenso problema com isso. Coloquem uma peruca, mas não se deixem acabrunhar, porque quando nos deixamos é o pior.

 
Simão Ribeiro
Muito bem, temos o João Ferraz Diogo do Grupo Laranja.
 
João Ferraz Diogo

Bom dia a todos.

Todos sabemos o cuidado que devemos ter a utilizar as palavras em público, que ao ser mal empregues podem inverter o sentido de voto numa eleição e como todos sabemos há pouco aconteceu isso com a oposição.

Posto isto, gostaríamos de saber a que tipo de estratégia e/ou formação técnica mais recorrem os dirigentes políticos, uma vez que nem todos tiveram a oportunidade de vir aqui à formação da Universidade de Verão, até porque muitos se calhar eram novos demais para vir cá.

Fica a pergunta, muito obrigado.

 
Dep.Carlos Coelho

João, a nossa preocupação aqui na Universidade de Verão é que isto seja uma boa oportunidade de formação. Portanto, temos um princípio ético que é não vos mentir. Aliás, esta sessão é à porta fechada, não há jornalistas porque não me parece razoável termos jornalistas numa sala onde vos explicamos como é que têm de falar com eles.

Eles pedem sempre para assistir, mas nós dizemos que não, assim como não estão presentes quando vocês são protagonistas, como por exemplo na apresentação dos trabalhos de grupos e na simulação de assembleia. Não há jornalistas na sala nem o broadcasting da nossa sessão, para vocês estarem completamente à vontade. Podem fazer as piruetas que quiserem, que ninguém vos vê, com exceção de nós, que estamos aqui na sala.

Portanto, não vos vou mentir, vou ser brutalmente sincero. A maior parte dos políticos não se prepara. Esta formação que vocês estão a fazer, a maior parte dos políticos não faz.

O secretário-geral do partido, José Matos Rosa, pediu ao Instituto Sá Carneiro para organizar algo parecido com o "Falar Claro” para as últimas eleições autárquicas. Nós fizemos seis ações em todo o país. Mas só chegámos a 8% dos candidatos do PSD, porque era malta que estava disponível para isso.

Depois, há políticos que têm um maior profissionalismo. Um dos políticos mais profissionais que eu conheço é o Prof. Cavaco Silva, que tem um problema de dicção. Quando foi para Primeiro-Ministro teve aulas de dicção com a Glória de Matos - isso é conhecido - para melhorar a dicção. Portanto, ele percebeu que tinha alguma deficiência e que tinha de a trabalhar.

As maiores insuficiências são ao nível da comunicação e para isso há assessores de comunicação, e ao nível da dicção e do suporte de políticas. O Rodrigo falava disso a propósito de focus group. Pedia talvez ao Rodrigo para complementar a minha resposta, explicando um pouco a função dos assessores de comunicação de um político profissional, como é que se trabalha com o focus group , esse instrumento de sondagem qualitativa, para construir uma mensagem eleitoral mais apurada.

 
Dr.Rodrigo Moita de Deus

Bom, na prática aquilo que se faz num focus group é tentar perceber o que o eleitorado pensa e, muitas vezes, o que é que sente. São duas coisas completamente diferentes: aquilo que pensa e aquilo que sente.

Como vos disse, o sentimento é um criador de preconceitos e, portanto, daí o que fazemos é tentar interpretar quais são os feelings que as pessoas têm em relação aos políticos e às políticas, às palavras, às cores, aos ambientes, às circunstâncias, ao caso da Grécia, ao caso do défice, à Maria Luís, ao António Costa, por aí fora.

Muitas vezes, recorremos a metáforas ou analogias que permitem ter uma leitura mais perspicaz. Por exemplo, fazemos muito a analogia do planeta, do universo, do animal: se António Costa fosse um animal, qual seria? Por aí fora.

Depois, há um assessor de comunicação, ou há uma equipa de comunicação que trabalha e tenta converter aqueles resultados em mensagens que consideramos chave. O que é que os políticos fazem ou deveriam fazer?

Aqui friso aquilo que o Carlos tentou explicar, que é que há muito amadorismo mesmo. Nada disto é muito profissional. A maior parte das pessoas que veem na televisão não se preparam de facto, nem para um debate, o que é uma coisa até inacreditável.

Porque a maior parte dos políticos estão tão rotinados naquela coisa de que falam todos dias, que acham que não precisam sequer de ver notas. É por isso que as gaffes acontecem e é por isso que aquele outdoor do PS sai. É porque ninguém fez o fact check , saber se a senhora era mesmo desempregada, ou se saber mesmo se chamava Maria ou Antonieta. Isso é falta de trabalho, excesso de confiança.

O que é que então o assessor de comunicação faz? Prepara uma série de mensagens-chaves que são a base para os vossos soundbites.

Depois o que é que se pode fazer com os políticos? Normalmente, hoje em dia costuma ser mais comum os políticos terem umas sessões a que chamamos pomposamente "media training” ou sessões de public speaking. Nelas, simulamos entrevistas, ou seja, obrigamos o político a ter as respostas prontas e preparadas, e noutros casos são simulações de discurso em público. Essa é a melhor forma de preparar, mas como o Carlos explicou são casos raros.

Queria cruzar a pergunta da Carlota com isto. Gostei imenso da explicação do Carlos. De facto, não podemos ficar nunca escravos das nossas fragilidades, é mesmo disso que se trata. A única forma que temos de não ficarmos escravos das nossas fragilidades, aliás, são três formas: trabalho, trabalho, trabalho. Depois disso, mais um bocadinho de trabalho e trabalho mais uma vez.

Lembro-me de uma cena absolutamente disparatada do Presidente de Câmara de Lisboa eleito pelo PSD, chamado Carmona Rodrigues, que tinha fama de ser engenheiro e grande técnico, quando saiu para uma ação de campanha sobre parques de estacionamento.

Disse que iam inaugurar quatro parques de estacionamento, estava uma câmara a filmar, o vídeo existe e está no Youtube. O jornalista fez uma pergunta que nunca nenhum jornalista se lembraria de fazer: quais eram. Ele não sabia responder, ficou titubeante e a estalar os dedos como quem se queria lembrar. Isto é falta de trabalho, na prática.

Era uma questão simples: pegar num papel pequeno, tomar as notas todas e só sair de casa quando temos a certeza do que vamos dizer.

 
Simão Ribeiro
Segue-se a Iva Carla Meireles, do Grupo Castanho.
 
Iva Carla Meireles

Bom dia a todos.

A nossa questão, do nosso Grupo, é mais a nível pessoal. Que soluções apresentar face a um bloqueio num discurso das vossas intervenções políticas? Como é que deram a volta quando estiveram nessa situação?

 
Dep.Carlos Coelho

Iva, não me recordo de nenhuma situação dramática. Portanto, essa seria mais interessante sob o ponto de vista pedagógico. Já me aconteceu perder-me a meio da intervenção. Mas como organizo sempre a intervenção com base em tópicos, passei para o tópico seguinte. Depois, apercebi-me que havia uma coisa importante que não tinha dito.

Dou-vos um exemplo concreto. Não sei se se aperceberam de que quando eu estava a fazer a minha apresentação e falei na equação comunicacional, quando passei a palavra para o Rodrigo ainda tinha uma coisa para apresentar, que era quando aparece o emissor, a mensagem e o recetor havia depois o contrário. As setas invertem-se: o recetor passa a emissor e o emissor passa a recetor.

Neste momento, estou a falar convosco, mas quando a Iva faz a pergunta a nossa relação de comunicação inverteu-se. Ia dissertar sobre isso, dizendo uma ou duas coisas. Estive uns segundos a pensar. Depois de dar a palavra ao Rodrigo dizia: "Ó Rodrigo, espera aí que me esqueci disto”, mas cortava um bocadinho do ritmo e tínhamos demasiado tempo para comunicação. Portanto, a nossa ideia era acelerar e não atrasar.

Ou, então, eu ter a oportunidade de mais tarde, nas respostas, suprir essa falha. Foi isso que fiz. De uma forma geral, passar à frente é a melhor solução porque o embaraço é terrível. Ficamos nós embaraçados e ficam as pessoas que nos estão a ouvir. Passar à frente, portanto, num bloqueio. Se o bloqueio for terrível, se ficarmos engasgados e não conseguimos dizer mais nada, não sei como é que se faz para ultrapassar uma situação dessas porque nunca a vivi, mas de facto é uma situação muito embaraçosa.

De uma forma geral, é passar à frente, não cair na pressão dramática de que cometemos ali um lapso. Corrigimos mais tarde, conseguimos reparar e é a melhor resposta que lhe posso dar.

 
Dr.Rodrigo Moita de Deus

Falta a frase dos "imprevistos dão muito trabalho”. Os meus imprevistos dão sempre imenso trabalho e, portanto, sempre que vou improvisar tive imenso trabalho na noite anterior. Pelo menos na noite anterior, pois não pode haver hipótese, não há outra alternativa, é trabalho, trabalho, trabalho.

Mas, mesmo assim, há sempre a possibilidade de a coisa correr mal.

Vou-vos contar um episódio que aconteceu comigo na terra do senhor deputado, em Angola. Eu ia falar à Assembleia Nacional de Luanda sobre um tema delicado: "Liberdade de Imprensa”.

Sabia que aquilo podia ser utilizado para criticar o governo e, portanto, levaram-me a reuniões na embaixada, o Ministério dos Negócios Estrangeiros chamou-me e disseram-me: "Você veja lá, que você tem má fama. Não seja parvo”. Ao que eu respondi: "Eu, que sou tão bem comportado?”.

Correu lindamente, fiz um PowerPoint com 30 slides , tinha ali tudo. A conferência era às nove da manhã no Parlamento, cheguei lá às nove em ponto com tudo preparado e trabalhado, não havia hipótese nenhuma, estava tudo impecável.

Perguntei: "Vamos então começar, onde é que ligo o computador?”. Eles disseram: "Computador?”. Eu expliquei que sim, pois ia fazer uma apresentação no PowerPoint. Ora, eles disseram que eu ia falar no púlpito.

Também não havia tempo para imprimir. Portanto, fiz à Carlos, pensei que ia ter de falar durante uma hora sobre esse tema sem ter as minhas notas, um papel sequer e tinha tido imenso trabalho a preparar no computador.

Falei, lindamente, achei que correu lindamente e pelo menos deram-me os parabéns a seguir, apesar de que nunca mais me convidaram para lá voltar.

[RISOS]

Se perguntarem o que é que aconteceu, o que eu disse, não faço a menor ideia, mas fiz à Carlos "ai é, então siga”, nunca parar, nunca hesitar, até que os nossos próprios percalços pareçam coisas programadas. Até terem essa rotina e os percalços parecerem coisas programadas. A audiência ainda fica em dúvida a pensar "será que ele fez isto de propósito?”.

[RISOS]

 
Simão Ribeiro
Seguimos com a Marta Monte, do Grupo Roxo.
 
Marta Monte

Bom dia a todos. Um dos maiores problemas que se aponta ao governo é a má comunicação. Gostaríamos de saber se partilham dessa opinião e como é que podem melhorar essa comunicação. Será que os ministros não tiveram a oportunidade de assistir à mesma aula a que nós estamos a assistir?

Obrigada.

[RISOS]

 
Dr.Rodrigo Moita de Deus

Isso era a pergunta que toda a gente queria fazer. Nós queixamo-nos sempre da comunicação do nosso partido. Também faz parte.

Fazemos isto há 11 anos. Parecemos já um casal antigo, já a caminho de bodas e todos os anos, independentemente de quem é o líder, toda a gente diz isso. Quando era o Santana Lopes o problema era a comunicação, quando era o Marques Mendes o problema era a comunicação, enfim, o problema é sempre a comunicação.

Aliás, é uma coisa extraordinária: o partido nunca tem outro problema que não seja a comunicação.

[RISOS]

Qualquer coisa e é sempre a comunicação. Faz lembrar uma coisa que eu vi uma vez na televisão. Havia uma greve das pessoas que carregam as malas nos aeroportos. Estava tudo atrasado nos voos e uma senhora dizia que o problema era a comunicação. Eu pensei: "Não, o problema é não haver malas”, não é a comunicação.

Isto tem tudo a ver com a questão da comunicação do governo. Está à espera que o governo comunique? Eles têm é de governar. São prioridades.

Primeiro o governo serve para fazer aquela coisa que as pessoas até desvalorizam, que é governar, depois podem dar algumas explicações. Isso tem de ter uma estratégia e esta foi sempre assumida desde o início.

Há dois anos que ouvi uma frase que nunca me hei de esquecer, até porque estava no meio de uma campanha, que é "que se lixem as eleições”. Eu ouvi. Você não ouviu? Do nosso Primeiro-Ministro. Foi uma frase impecável num jantar do grupo parlamentar.

Não estava preocupado com as eleições. É justo. A prioridade de um governo é governar. Comunicar bem, ou não comunicar. Se o problema for da comunicação, o que não acredito porque também é verdade que estas técnicas que vos estamos a disponibilizar não servem para dizerem às pessoas aquilo que as pessoas querem ouvir, isso é demasiado fácil.

Curiosamente, é raro correr bem quando acabam a dizer aquilo que as pessoas querem ouvir.

Ultimamente, se for ver os outros casos dos outros países europeus, nunca correu bem, nunca mesmo. Dizer aquilo que as pessoas querem ouvir é má estratégia de certeza. A estratégia deste governo foi, desde sempre, não dizer às pessoas aquilo que elas querem ouvir mas aquilo que elas precisam de ouvir. Isso é comunicação.

 
Simão Ribeiro
Muito bem. Temos o Vasco Ferreira, do Grupo Verde.
 
Vasco Ferreira

Gostaria de cumprimentar todos os presentes. Passarei diretamente à questão: após a mais recente crise económico-financeira vivida, alastrada a uma crise axiológica e social, que trouxe ao cidadão comum um sentimento de revolta em relação ao poder político, em que medida as opções de comunicação de um candidato ganham um novo relevo?

Um político deve após um período de dificuldades apresentar-se com a maior descontração e fluidez, ou demonstrar uma atitude mais séria e ponderada perante os seus eleitores?

 
Dep.Carlos Coelho

Vasco, isso depende do momento e do interlocutor. A nossa comunicação tem de ser adaptada às circunstâncias e ao target. Exemplos concretos para nós percebermos: está provado que o sorrir é fundamental. Há um estudo de uma universidade britânica o fator de memorização das feições está ligado ao sorriso. Ou seja, memorizamos melhor uma cara que sorri do que uma que não sorri.

Dá ideia de que o nosso cérebro não quer recordar caras não-sorridentes. Portanto, se um político sorri fica mais na memória das pessoas do que se um político estiver de cara feia.

Vou ao funeral de uma personalidade qualquer, não posso sair de lá a sorrir, não é o contexto para isso, senão dizem que me vim divertir para o funeral. Portanto, contexto obriga-me a ter uma atitude mais sóbria.

Estou aqui na Universidade de Verão, estou convosco à vontade, mas se estivesse a falar neste momento na Assembleia da República não estaria com este pólo nem com estes jeans e sapatilhas. Estaria vestido na mesma, mas há um preconceito de que não é forma de estar na Assembleia da República e, portanto, teria de me adaptar à circunstância.

Uma vez, estive num funeral de uma pessoa importante e apareceu uma senhora elegantemente vestida toda de vermelho. Toda a gente disse que ela não tinha juízo nenhum. Ela estava muito elegante, mas a cor não parecia adequada à circunstância porque se criou o preconceito em Portugal de que aos funerais não se vai de vermelho.

Não fiquei nada ofendido, acho que a família do defunto também não, mas a maior parte das pessoas não falava de outra coisa. Ninguém falava se o defunto tinha sido boa ou má pessoa, mas falavam do vestido da senhora.

O meu target também é fundamental, porque são as pessoas a quem eu me estou a dirigir. Podem gostar mais de uma atitude ou menos e, portanto, são as circunstâncias e o target que determinam qual é o meu comportamento. Não há aqui uma receita. Algo que fica bem num lugar não fica bem noutro.

Paulo Portas apareceu numa campanha das europeias com um chapéu muito rural que ele tinha usado numa feira qualquer. Nas circunstâncias em que ele usou aquilo era ridículo, toda a gente falava do chapéu do Paulo Portas.

Ele é um bom comunicador, podia ter feito os melhores soundbites , que ninguém estava a ouvir o que ele estava dizer, estavam todos a olhar para o chapéu.

 
Simão Ribeiro
É a vez do Manuel Torres, do Grupo Encarnado.
 
Manuel Poêjo Torres

Boa tarde a todos, já é quase de tarde. Senhor reitor, o Grupo Encarnado tem uma questão particular à sua experiência internacional. Nós gostaríamos de saber, dada a sua experiência no Parlamento Europeu, que elementos linguísticos é que enriquecem a arte da diplomacia e que são eficazes na resolução de conflitos inter pares.

Obrigado.

 
Dep.Carlos Coelho

A pergunta tem duas dimensões. Na lógica específica do Parlamento Europeu, nós na reunião temos tradutores.

Não sei se conhecem a expressão "tradutor traidor”. A tradução retira sempre alguma coisa à comunicação. Um exemplo concreto: eu era presidente de uma comissão de inquérito sobre as atividades da CIA na Europa e a determinada altura quando estávamos a votar as recomendações, assisti a uma divisão esquisita nas pessoas. Não era uma divisão ideológica, havia uma fratura. Percebi que havia uma deputada que estava a esbracejar que aquilo não fazia nenhum sentido e suspendi a votação para vermos o que se passava.

A senhora deputada disse que não fazia sentido estarmos a recomendar aquilo à UE. Olhei para o texto e não percebi aquilo que ela estava a dizer. O que é que se passou? Era uma emenda espanhola que dizia " recomendo a los Estados Unidos (EU) ” e era a recomendar o encerramento da base de Guantánamo. O que é que os tradutores fizeram? Puseram EU como European Union. Portanto, metade da sala, portugueses, espanhóis, franceses, italianos, tinham a versão correta que recomendava aos EUA e o resto da sala tinha como recomendação à União Europeia. Foi um problema de sigla: Estados Unidos ou European Union ?

Portanto, é um problema de tradução que altera completamente o sentido. Uma coisa é recomendar aos Estados Unidos e outra é a nós próprios. Naquele caso não fazia sentido nenhum recomendar à União Europeia o encerramento da base de Guantánamo, pois não tínhamos nada que ver com isso. Isso é o "tradutor traidor”.

O que significa que nalguns momentos é arriscado falarmos a nossa língua, sobretudo se estiver em causa o interesse de Portugal. Nas reuniões formais falo sempre em português, exceto quando receio que a tradução seja muito má e que seja um caso muito importante para Portugal. Então, falo uma das línguas que é falada, ou francês, ou inglês, ou espanhol.

Nos contactos de bastidores tenho-me safado porque geralmente há alguém que fala uma destas línguas. Mas há pessoas que não falam nenhuma destas línguas e com essas não posso falar sem a ajuda de alguém. Há colegas meus alemães que só falam alemão.

Já pensei em aprender alemão, mas o tempo que se perde naquilo depois não compensa. Há colegas italianos que só falam italiano. Portanto, isso é uma menos-valia. Como é que vão representar o país deles num fórum internacional em que não conseguem interagir com os colegas?

Sendo claro que na maior parte dos órgãos internacionais, designadamente os comunitários, não temos de ter outras valências linguísticas, podendo falar a nossa língua pois há tradutores que asseguram a tradução - a tradução nem sempre é de qualidade -, mas isso impede-nos de fazer os contactos de bastidores que são essenciais para a nossa função.

Não conseguimos estabelecer plataformas e compromissos se não houver comunicação. Era aquilo que eu falava da sintonia do discurso com o exemplo do chinês. Se não tivermos uma língua em comum é complicado.

 
Simão Ribeiro

Vamos agora passar a perguntas do "Catch the Eye”. Queria saber quem deseja fazer perguntas.

Vou entretanto tentar ter mais ou menos perceção da sala. Peço-vos, em primeiro lugar, a compreensão para algumas questões: vamos tentar distribuir as perguntas por todos os grupos e vamos dar também prioridade a quem ainda não interveio na própria aula.

Portanto, neste sentido, temos o Gabriel Albuquerque, do Grupo Cinzento e depois o Paulo Martins, do Grupo Amarelo.

 
Gabriel Mateus de Albuquerque

Bom dia a todos os presentes. Assisti ao lançamento da autobiografia de Passos Coelho, em Lisboa, apresentado pelo Eng.º Carlos Moedas. Nessa altura, ele falou e apresentou-nos acontecimentos que tinha vivido juntamente com Passos Coelho.

Um deles foi uma reunião que teve com Angela Merkel em que estavam os três mais um assistente de Angela Merkel e a reunião começou a ser feita com Merkel a falar em alemão e Passos a falar em inglês. Passos estava à espera que Merkel tivesse respondido em inglês, mas ela respondeu em alemão.

Portanto, a minha dúvida prende-se com haver ou não menosprezo pela língua nacional quando se vê um país usar a língua inglesa enquanto o outro responde com a sua língua nacional.

 
Paulo Martins

Bom dia a todos. A minha questão prende-se com o seguinte facto que o Dr. Rodrigo há pouco falou sobre os jornalistas, a ponte que devemos fazer quando estamos encravados. É que hoje em dia, cada vez mais, vemos os jornalistas mais bem preparados do que os políticos.

Caso o jornalista arranje essa ratice de fazer novamente a pergunta, o que é que devemos fazer?

 
Dr.Rodrigo Moita de Deus

Vou começar pelo Paulo: portanto, o cenário é um jornalista que está mais bem preparado do que o político. É melhor o político mudar de profissão rápido.

[RISOS]

Sendo político acaba entalado por um jornalista porque este está mais bem preparado? Não pode acontecer. Era o que eu estive a dizer: trabalho, trabalho, trabalho. Não pode acontecer.

Se for uma coisa de política, de facto, não pode mesmo acontecer. É impensável, tão impensável, que de facto o político tem mesmo de pensar em mudar de profissão. Ainda para mais porque hoje em dia as redações funcionam de forma diferente. Hoje em dia há cada vez menos especializações dentro da redações. Antigamente, tínhamos cinco ou seis jornalistas de vários órgãos de Comunicação Social, que só cobriam economia, outros cinco ou seis que só cobriam a área dos transportes, outros cinco ou seis que só cobriam a área de desporto e isso hoje em dia há cada vez menos.

Os jornalistas são cada vez mais generalistas. Portanto, é cada vez mais difícil um político deixar-se entalar, porque senão na prática é sinal de incompetência pura e dura. Mesmo incompetência porque não leu o papel. Pode eventualmente ser apanhado num facto que não tenha conhecimento, isso é outra coisa; agora, falta de preparação não pode acontecer.

A questão do Gabriel a propósito do inglês, tenho ideia - mas isso é porque sou muito vaidoso - que tenho um inglês britânico com sotaque mesmo. Consigo falar em inglês nas mais difíceis circunstâncias do Mundo. Cheguei a Nova Iorque e percebi que eles não me percebiam e eu não os percebia a eles.

Primeiro, porque em Nova Iorque já nem americanos há; há colombianos, mexicanos, espanhóis, toda a gente a querer falar inglês. Portanto, o inglês perdeu essa particularidade de ser inglês. O inglês já não é inglês e eu que falava inglês britânico tenho mais dificuldades para me fazer compreender do que um espanhol a tentar falar português.

Mesmo. Às vezes sinto-me completamente taralhoco.

Existe muito a mania de que a questão de falar a própria língua é uma questão de afirmação de soberania, que é aquilo que você me estava a dizer. A questão da afirmação da soberania através da língua, a língua na comunicação serve para sermos eficientes na comunicação e não vale de muito, de facto, estarmos a falarmos em português para uma audiência em que depois na tradução perdemos metade do que queremos dizer.

Mas, a maior parte dos políticos continua a pensar dessa maneira, que a língua é uma questão de soberania. Eu sei falar alemão, mal, s chlecht, aber mein deutsch ist sehr sehr schlecht.

Passar-me pela cabeça que posso começar uma reunião com uma pessoa de outra língua na minha língua natal, na esperança que depois o tradutor faça o trabalho, é presunção, é falta de eficácia. Seja ela da senhora Merkel, seja ela do nosso Primeiro-Ministro. A soberania não está na língua, na forma como a defendemos.

Olhe para os franceses. Se há língua mais protegida no Mundo é a língua francesa e olhe para a decadência da própria língua francesa, portanto a solução não está por aí. A língua por usar é uma língua morta à partida. Daí a tentarmos impingir a nossa à dos outros acho que é ruído na comunicação.

 
Dep.Carlos Coelho

Gabriel, sob o ponto de vista protocolar aquilo que diz faz todo o sentido. O Presidente da República quando se desloca em representação de Portugal deve falar português, porque há aí um valor simbólico de representação de Portugal.

Ainda assim, o Presidente Jorge Sampaio achou que representava melhor o interesse de Portugal falando inglês, que aliás ele fala muito bem.

Não vi ninguém queixar-se disso.

Na cena que reproduz, acho que não há nenhuma falta do Primeiro-Ministro português em ter falado em inglês, pois ele queria comunicar diretamente com a senhora Merkel.

Acho que a senhora Merkel não esteve à altura, ela podia ter respondido em inglês para ambos comunicarem diretamente. É verdade que a senhora Merkel não fala inglês tão bem quanto o nosso Primeiro-Ministro e portanto tem mais dificuldade. Provavelmente terá sido isso.

Mas, quando ela está a falar com um colega e ele fala uma língua veicular, comum, e ela refugia-se na sua língua pode até dar uma ideia de arrogância. Nessa situação quem está mal, eventualmente, não é o Primeiro-Ministro português mas a chanceler alemã.

Admito que isto tenha a ver com a menor capacidade dela em falar inglês. Ela fala russo muito bem. Por quê? Porque ela era da Alemanha comunista e a língua internacional deles era o russo, não era o inglês. Portanto, as competências linguísticas dela e da geração dela são diferentes das nossas.

Peço desculpa, nós devíamos ter explicado isto: as dez primeiras perguntas foram perguntas dos Grupos, mas a partir de agora qualquer participante da Universidade de Verão que tenha vontade de fazer perguntas sobre o tema, levanta o braço e o Nuno dá a palavra.

Portanto, o "Catch the Eye” é dar a oportunidade a pessoas que têm interesse no tema, independentemente de terem sido selecionadas pelo grupo. Estão à vontade, temos ainda uns 25 minutos para fazer perguntas e dar respostas.

 
Nuno Matias
Como podem compreender, no início da semana é difícil conhecer todos. Vou só pedir que para já se identifiquem para fazermos todos aqui um registo e depois vamos chamando cada um para fazer as questões.
 
Nuno Pinto Dias
Boa tarde a todos. Mantendo o foco na autenticidade do orador, que traços de personalidade é que devemos reforçar e, por outro lado, suprimir para criar no nosso auditório um sentimento de proximidade?
Muito obrigado.
 
Nuno André Ramos
Bons dias a todos. Até que ponto é correto ou não-perigoso recorrer ao humor no discurso político?
 
Dr.Rodrigo Moita de Deus

Posso eu começar. Relativamente à pergunta do Nuno Dias, não diria suprimir. A não ser que diga "pá”, no final de cada frase, aí concordo que tenha de ser suprimido rapidamente.

Evidentemente tem virtudes e fragilidades, não tem de as suprimir, não vai conseguir fazer isso; agora, o que o trabalho permite é evidenciar os seus pontos fortes e mitigar as suas fragilidades. Há outras pessoas que utilizam as fragilidades para se falar.

Sobre isso é trabalho, trabalho, trabalho, uma vez mais, porque tudo de corrige.

Imagino que vocês saibam quem é o José Carlos Castro, o jornalista que está agora no Correio da Manhã da TVI. Tem um português impecável, certo? Quando eu o conheci há uns anos atrás ele falava com sotaque do Porto, era daqueles tão acirrados que não percebia o que ele estava a dizer. Era mesmo à séria, eu ficava banzado com aquilo e uns anos mais tarde, nem foi muito tempo, foi trabalho, trabalho, trabalho e hoje em dia tem aquele sotaque de Lisboa que chamam que é não tem sabor nenhum na língua. Não ter acento quer dizer que se é de Lisboa, que é uma coisa extraordinária, eu que sou lisboeta não acho normal, mas toda a gente diz isso.

Não é suprimir, é mitigar e às vezes até puxar pelas suas fragilidades de maneira a que deixe de ser fragilidade. Se assumir um problema qualquer que tem, se começar com "desculpem lá, mas o meu sotaque é que é português e o vosso não é nada”, está resolvido o problema logo à partida. Começou bem. Isto tem que ver com a questão do humor. Se o humor é perigoso? O humor é a forma mais eficaz de comunicar. Não há mais eficaz.

Aliás, o sarcasmo é um instrumento letal. Para quem não sabe, colaborei com o Prof. Marcelo Rebelo de Sousa várias vezes, sou Marcelista, utilizando o disclaimer , não falo sobre presidenciais, já sei, o Carlos proibiu-me.

Mas colaborei com ele e uma das coisas que nós fizemos foi uma campanha do referendo do aborto, a segunda, e aqui o vosso amigo teve uma ideia que foi genial, que era fazer uns vídeos para pôr no Youtube.

O Professor disse que isso ia rebentar a escala, até porque não tínhamos dinheiro para fazer outdoors. Consegui arranjar a câmara e meti o Professor a falar para a câmara; pusemos os vídeos no Youtube, o que na altura foi revolucionário, já foi há mais de dez anos. O Professor lá gravou uns vídeos absolutamente extraordinários em que falava sobre a questão do aborto e a legislação, porque é que nós éramos "nem não nem sim, mas assim não”, aquelas coisas à Professor.

Uma coisa fantástica, estava a correr às mil maravilhas até que os vídeos apareceram mesmo nas sondagens. Tínhamos um tracking de "sim” e "não” e depois tínhamos os vídeos do Professor Marcelo que tinha quase tanta visibilidade quanto o resto das ações de comunicação dos movimentos formais.

Até que, num triste dia, num programa qualquer dos Gatos Fedorentos eles fizeram um sketch sobre o assunto: "Liberalizar!”, dito de uma forma a imitar uma mania que o Professor tinha na altura, e ligaram-me a avisar que o sketch ia sair. Fiquei aflito liguei ao Professor a dizer que eles fizeram um sketch e que aquilo ia ser mau. Ele disse: "Não. Isso é humor, é um programa de paródia” e eu insisti a dizer que o Professor não estava a ver bem isso, porque eles são mesmo bons e quando metem na cabeça fazer coisas, aquilo é mesmo perigoso.

O Professor continuou a dizer que não era nada. Então, saiu o vídeo. Tínhamos um total de 800 mil visualizações, lembro-me mais ou menos do número de cor. O vídeo oficial, o primeiro do Professor Marcelo tinha 800 mil visualizações no Youtube, o que na altura era uma coisa de arraso. O vídeo do Ricardo Araújo Pereira, do José Diogo Quintela, ao fim de 24h tinha um milhão e meio. Havia mais umas 700 mil pessoas que tinham visto o vídeo e que nem sequer tinham visto o original. Isso é que me preocupou.

Liguei ao Professor, fui ter com ele à Faculdade de Direito de Lisboa, aqueles corredores escuros e amplos, e o Professor sempre a explicar-me que aquilo era um programa de humor e que eu não estava a perceber, quem percebia de política era ele e que eu estava preocupado com coisas que não devia.

Passámos por uns miúdos e há uns que fazem: "Liberalizar!”, a imitarem o sketch.

[RISOS]

Hoje em dia, acho que percebemos todos o impacto que aquilo teve. Não estou a dizer que perdemos a campanha por causa disso, mas aquilo foi uma sova tão grande, tão grande, que se você for ao Youtube procurar os vídeos do Prof. Marcelo não os vai encontrar, porque eu os tirei.

Ficou só o vídeo do Ricardo Araújo Pereira. Não vale a pena, não vale a pena.

O humor é perigoso? É. Porque de facto é o instrumento de comunicação mais eficaz que você pode ter. O humor permite satirizar, ridicularizar, sem nunca ser insultuoso. Agora, também é uma arma complicadíssima de se utilizar, não é para todos.

Vale a pena os políticos estarem a fazer de humoristas? Não, não vale. Os políticos não são humoristas, nem têm de fazer de humoristas. Agora, qualquer político anglo-saxónico não começa uma intervenção sem antes de dizer uma graça. Por quê? Porque a graça permite às pessoas sorrirem e assim estão a deitar abaixo as defesas, estamos a captar a atenção para nós.

Eu comecei com o peixinho, é uma maneira simpática, não é? Aquilo, validade científica, tem alguma, como é óbvio. Tem alguma facilidade de apreensão para vocês, mas sobretudo tem a vantagem de quebrar o gelo.

"Boa, este sou eu, sou muito divertido, muito maluco, muito diferente”, não é? Têm o Carlos Coelho que é muito chato, tem estes esquemas e sou eu que tenho o peixinho no boião, pronto, a partir daí começar. É criar a empatia e quebrar as defesas; criar empatia com o público, e o humor permite isso.

Portanto, utilizado com peso e medida, como tudo na vida, funciona como nada mais.

 
Dep.Carlos Coelho

Nuno, concordo contigo com aquilo que o Rodrigo disse. Diria que o humor é como o sal na comida, é quanto baste.

O Rodrigo agora fez referência a isso, é uma questão de cultura, porque em Portugal tudo o que é humor a mais é trágico, porque um político não é um palhaço. A lógica não é fazer rir. Há outras culturas em que acham que não. Vêem aquele jantar anual do Presidente dos Estados Unidos com os jornalistas da Casa Branca e é uma cena completamente apalhaçada. Era impossível em Portugal.

Portanto, na nossa cultura o humor a mais é trágico, por isso se não conseguem acertar na medida 9.6, no ponto espetacular de equilíbrio entre o humor e o exagero, é melhor passarem por alguém sem humor do que por alguém com humor a mais.

Ou seja, é preferível passarem por políticos sisudos do que por palhaços. Porque em Portugal o palhaço não tem nenhuma credibilidade

 
Nuno Matias

Muito bem, Carlos. A seguir, Ana Catarina Neves, do Grupo Laranja, e depois o Laurindo Frias do Grupo Roxo.

Entretanto, deixava abertas as inscrições para que vão levantando o braço e dando indicação, está bem?

 
Ana Catarina Neves

Boa tarde. Apresento-vos uma pergunta do Grupo Laranja. Partindo do princípio que os responsáveis pelas campanhas eleitorais sabem os pressupostos que aprendemos aqui no "Falar Claro”, por que continuamos a ter 30 minutos de campanha eleitoral na televisão?

Confesso que quando estamos na parte das eleições é um bocado secante termos constantemente, antes ou depois do telejornal, 30 minutos a levarmos com campanhas eleitorais.

Porque é que isto continua a suceder?

 
Laurindo Frias

Acho que me estão a ouvir. Se não perceberem alguma palavra vou tentar explicar.

A minha pergunta: nos dias de hoje a nossa classe política tem dois discursos. Vou dar um exemplo: vai ter de se aumentar os impostos, então, temos um lado a dizer que vamos ter de pagar impostos e outro lado a dizer que não temos de pagar impostos e que até nos vão dar dinheiro.

Qual é a melhor maneira, até para passar uma boa imagem da pessoa que vai enunciar essas medidas, de anunciar que a pessoa vai ter pagar impostos quer queira, quer não?

Porque o que temos assistido nos últimos anos não para. De um lado há sempre aquele que diz que é preciso aumentar os impostos e o povo não gosta; por outro lado, que é mentiroso, temos quem diz que não é preciso aumentar impostos, e o povo também não gosta. Como é que passamos uma boa mensagem para o nosso povo que é a massa que vota, para ficarem minimamente satisfeitos?

Claro que ninguém fica satisfeito com impostos, mas como é que se pode fazer uma pequena brincadeira, "por assim dizer”, para tapar um pouco a mensagem que queremos passar a sério?

 
Dep.Carlos Coelho

Muito bem, eu começo e depois o Rodrigo complementa. Vou começar pelo Laurindo. Não sei se repararam, mas o Laurindo fez uma brincadeira com o sotaque. Há pessoas que não gostam de sotaque e ele jogou com isso dizendo que se não perceberem alguma palavra ele traduzia. É uma forma simpática de abrir logo o jogo. Acho que o sotaque dá riqueza à língua e que permite dar autenticidade ao discurso.

Gosto de ouvir os sotaques, mas há pessoas que não gostam. Em qualquer circunstância, o Laurindo antevendo que pudesse haver alguém na sala que não gostasse antecipou a crítica de uma forma que eu acho brilhante e portanto dou-lhe os meus parabéns.

Laurindo, não há resposta fácil para a sua pergunta. Agora, vou dizer-lhe o que acho sinceramente. Acho que as pessoas estão fartas de políticos mentirosos e, neste momento, o valor da credibilidade prevalece sobre a estética da mentira.

Isto é, é evidente que ninguém gosta de pagar mais impostos e que haja rigor e austeridade, mas se formos capazes de explicar que a alternativa é o desastre, as pessoas percebem que pelo menos estes estão a falar de uma forma séria e não estão a mentir.

Podemos ter a religião que quisermos. Sou católico, mas podemos ser ateus, agnósticos, ou termos outras religiões. A grande vantagem do Papa Francisco, concordando-se ou não com tudo o que ele diz, é a expressão de autenticidade naquilo que ele diz e na forma como ele vive o seu magistério.

As pessoas podem gostar ou não, mas ninguém diz que ele é um aldrabão, não, dizem que ele é sincero e que está a tentar viver aquilo com autenticidade.

A autenticidade e a credibilidade, hoje, são valores que prevalecem sobre tudo o resto. Acho que isso importa na mensagem.

Ana Catarina, como é que se explica que há 30 minutos de tempo de antena? Porque é de borla, a lei prevê e toda a gente usa. Não estou a dizer que devemos alterar a lei para que fosse a pagar, mas a razão de haver é porque é de borla. Portanto, é um produto que não é pago e como toda a gente percebe que a televisão ainda releva a despeito de tudo aquilo que o Rodrigo disse das redes sociais - temos de passar a mensagem num momento.

Não sei quantos pessoas ouvem o tempo de antena, mas o Rodrigo sabe e dará os números.

Mas seguramente são mais de meio milhão. Portanto, é ali um tempo de borla que o Estado me dá enquanto candidato para eu falar para pelo menos meio milhão de pessoas, se não forem mais.

Agora com os novos meios ainda tem a vantagem de eu poder usar esses filmes, ou até cortá-los, e passá-los nas redes sociais e inundar o Facebook, Twitter e Youtube com mensagens com aqueles filminhos.

É uma forma barata e é isso que justifica que exista isso.

 
Dr.Rodrigo Moita de Deus

A questão do Laurindo, o Carlos tem razão, foi bem aberta. Fiz uma campanha nos Açores e tive um problema com o tempo de antena. Fizemos um focus group para testar. No primeiro voz-off há a questão de locutor e nos Açores, não sei se conhecem bem aquilo, mas as nove ilhas têm nove sotaques. Nenhuma ilha fala igual à outra e, pior, reconhecem-se todos uns aos outros.

Ainda não sei. Imagino que o Laurindo seja de São Miguel. Sei reconhecer alguns, mas cada ilha tem o seu sotaque próprio. Teve a graça de estarmos a fazer a campanha e em S. Miguel está 50% da população dos Açores, por isso mal por mal pusemos um locutor de S. Miguel que ia fazer o tempo de antena que ia passar nas nove ilhas.

Chamámos o focus group que tinha pessoas das nove ilhas e que diziam que era inacreditável termos escolhido uma pessoa de S. Miguel. Experimentámos aquilo com mais duas ilhas, mas nenhum sotaque passava no crivo das outras oito ilhas. Nenhum. Optámos por uma coisa muito básica, que é o tempo de antena ter um voz-off que era de Lisboa, pois foi a única maneira de passar.

[RISOS]

Era um lisboeta a fazer o tempo de antena e foi aprovadíssimo no focus group. Isto para dizer o seguinte: dizer a verdade, de facto, pois tudo o que sejam tentativas para enganar as pessoas, como fazer conferências sobre o aumento de impostos no meio dos jogos de futebol, ou em vésperas de feriados, tudo aquilo é triste, triste.

A melhor forma de dizer é mesmo usando a verdade pura e dura. O brutal aumento de impostos. É a minha maneira, ir direto ao assunto.

Relativamente à Ana Catarina, porque tem a ver com as campanhas eleitorais e como é que elas se processam: a seguir ao 25 de Abril, o Estado português ficou convencido que os portugueses eram estúpidos. Como são estúpidos têm uma série de manuais de instruções para estúpidos. Por exemplo, há uma coisa absolutamente estúpida, que é você vota ao domingo, tem de ser na junta de freguesia onde reside, não pode ser noutra porque apesar de haver computadores tem de ser na sua junta de freguesia pois não vá o computador baralhar-se. O computador também pode ser estúpido.

Tem de ser a um domingo, depois de um dia de reflexão, porque você é tonta e, portanto, tem de pensar bem durante 24h em quem é que vai votar. Durante as eleições não pode haver campanha não vá você mudar de ideias, que é uma coisa absolutamente extraordinária, mudar de ideias durante uma campanha. Portanto, como somos todos tontos, o Estado permite-nos 48h de tonteria máxima e absoluta a fazer isso.

O sistema tem algumas vantagens, porém.

No Estado, durante anos, houve donativos privados e como havia sempre confusões entre políticos e capital privado, o Estado predispõe-se a pagar a sua campanha. Diz que você faz a sua campanha, que nós depois pagamos; tem de pedir um empréstimo para pagá-la, mas depois disso o Estado paga-lhe a campanha consoante o número de votos.

Diz também outra coisa: não pode usar os meios publicitários, é proibido. Não posso pôr mupis da minha campanha. Posso pôr outdoors , que são outra coisa, são os 8x3 e não posso usar os 8x3 especiais, tenho de utilizar uns especiais que tenho de pedir para colocar.

Depois há outra coisa: não posso comprar spots de televisão. Por quê? Porque isso colocaria os partidos em desigualdade, teoricamente. Porque há uns partidos que têm mais dinheiro do que outros, apesar do Estado pagar todas as campanhas. Ou seja, não posso colocar um anúncio do PSD no meio do anúncio do Fairy e do Tide. Não é possível, é proibido.

Portanto, o Estado para compensar tudo isso dá-me outra ferramenta, chamada tempo de antena. Nas rádios e nas televisões, é obrigatório para qualquer órgão de Comunicação Social, o tempo de antena é um espaço igualitário, portanto tenho o direito aos mesmos minutos que o PS.

Acontece uma coisa extraordinária, que era o que você estava a dizer, que é uma grande seca de meia hora vista por milhão e meio de pessoas. Tem mais audiência que a maior parte dos telejornais dos canais abertos.

Portanto, curiosamente, ainda é o único mecanismo que tenho para falar para mais de um milhão de pessoas. Em tudo o resto, os partidos não existem. Só poderiam se comprassem publicidade e, como não têm, o tempo de antena é o melhor.

Mas se pensarem que os partidos não conseguem falar para mais de um milhão e meio de pessoas, mesmo através dos telejornais porque são raros aqueles que têm audiência maior que um milhão, é uma coisa extraordinária.

Estamos a falar de uma população de dez milhões, cujos eleitores são cinco ou seis milhões. Como é que faz política a falar para menos de um milhão de pessoas?

 
Nuno Matias
Muito obrigado, Rodrigo. Portanto, tem agora a palavra a Beatriz Almeida, do Grupo Castanho, seguida da Carolina Patrício, do Grupo Rosa.
 
Beatriz Almeida

Muito bom dia. Gostaria de saber o que podemos fazer quando estamos perante um público que tem sentimentos negativos por nós e queremos alterar essa perspetiva, alterar aquilo que pensam relativamente a nós.

Obrigada.

 
Carolina Patrício

A minha questão é acerca de siglas. Como é que podemos definir se uma determinada sigla já é intuitiva, ou não?

Porque, por exemplo, a sigla PPP é muito utilizada e não sei se é fácil a conversão, se é instantânea, para Parcerias Público-Privadas. Como é que podemos definir isso, se o nosso público já intui automaticamente, ou não?

 
Dr.Rodrigo Moita de Deus

Carolina, a melhor maneira é de não falar com siglas. Repito: a melhor maneira de intuir isso é não falar com siglas. As siglas são parvas, são para tecnocratas e burocratas que têm de pôr siglas em tudo que fazem para conseguirem abreviar o tamanho dos documentos que estão a produzir.

As siglas são uma invenção administrativa utilizada para poupar trabalho aos burocratas, o que já de si é um contrassenso porque os burocratas existem exatamente para terem trabalho. Portanto, sem trabalho ficarão desempregados. Mas mesmo assim conseguiram inventar siglas.

As pessoas não percebem siglas, tal como não percebem números com mais de quatro algarismos. Porque o ordenado mínimo é o ordenado mínimo, mil euros é uma fortuna, dez mil euros baralham com 20 mil e se o senhor Sócrates meteu um milhão ou 27 milhões ao bolso é indiferente. As pessoas nem sabem o que é esse grau de grandeza e acontece o mesmo com as siglas.

Nem estão para aí viradas, o que não quer dizer que as pessoas sejam tontas, pois elas percebem perfeitamente o que é o SLB, evidente. SLB é uma coisa inconfundível, claro que sabem. Não estão é para aí viradas, já desligaram o cérebro, entram no zoning out se começa a falar por siglas de PPP, mais o PSD, mais o PS, afasta imediatamente as pessoas.

Beatriz, como é que você converte uma audiência que lhe seja completamente hostil? Eu adoro, confesso. É daqueles desafios que gosto. Uma vez fui para Coimbra dizer que a Universidade tinha de ser queimada, é uma frase do Aquilino Ribeiro "Coimbra só dará à luz no dia em que arder”.

Também gosto de ir a debates republicanos dizer que sou monárquico. Mas faço a coisa a sério, levanto-me digo que o meu nome é Rodrigo Moita de Deus e que, como alguns sabem, sou monárquico, católico, conservador e social-democrata e se pudesse privatizava muito mais do que o Passos Coelho. "Próxima pergunta. Está, ou algum problema com isso?” O melhor para conquistar uma audiência hostil é pôr as coisas como elas são.

Dizia: "Boa tarde, sou social-democrata, acho que o Passos Coelho tem umas tendências socialistas, que há ali umas coisas que foram vendidas e não foram, não é? Esses tiques de esquerda, mas enfim, no meu partido cabe tudo. Sou conservador em matérias sociais, católico como o caraças - vou mesmo à missa -, monárquico. Mais algum problema? Não? Siga. É a minha maneira.

Então, você acha que vai converter uma audiência de comunistas, esquerdistas? Não, estou é a falar para as pessoas que estão lá fora, para aqueles que estão indecisos.

Você enfia-se numa discussão com um tipo do Bloco de Esquerda, vai convertê-lo nalguma coisa? Claro que não, não o vai convencer de nada. Você será sempre a Beatriz betinha de Cascais, mesmo que não seja de Cascais, porque é social-democrata e já é sorte porque senão era do CDS.

Enfim, porque senão era do CDS. Antigamente havia meninas do CDS, vá.

[RISOS, APLAUSOS]

Não percebo onde é que vocês querem chegar, juro.

[RISOS]

É por estas e por outras que isto não é aberto à Comunicação Social, não é por causa de vocês.

Mas a pessoa tem preconceitos. Alguém do Bloco de Esquerda não é convertível. Portanto, a sua hipótese, a melhor, é com as pessoas que estão a assistir. Essas movem-se ou comovem-se com a sua autenticidade e franqueza. Isso sim é ferramenta, voltamos ao cerne da conversa, ou do debate: sinceridade e autenticidade. Se souber fazer isso bem, então conquistará simpatia e assim terá uma abertura para depois vender aquilo que tem para vender, na prática.

 
Nuno Matias
Infelizmente, a hora impede-nos de continuarmos a ronda de mais inscrições e, portanto, com alguma tristeza passo para o último bloco de questões. É, assim, o Emanuel Pereira, do Grupo Verde, e a Maria João, do Grupo Azul.
 
Emanuel Pereira

Sei que já foi falada a questão dos Gatos Fedorentos. Sei, mais ou menos, que supostamente eles vão voltar.

De que forma é que um político pode ir a um tipo de programa como o "Esmiúça os Sufrágios” em 2009, que levou todos os políticos da atualidade e que tinha um share muito grande?

Que comunicação é que um político deve ter num programa humorístico, mas que está a falar a sério?

 
Maria João Podgorny

Olá a todos. Queria expor-vos uma situação que me aconteceu recentemente e saber o que teriam feito no meu lugar.

Tive de defender a minha tese de Mestrado perante um júri de três pessoas e na sala só estavam esses três professores que eu queria impressionar, obviamente, porque era o meu júri.

Tinha 15 minutos para fazer a apresentação e estava bastante entusiasmada, confiante e apetecia-me fazer aquilo. Comecei a entrar na apresentação e reparo que dois dos três professores que estão na sala estão a mexer no telemóvel. Não estão de todo a ouvir o que eu estou a dizer.

Só havia mais uma pessoa na sala, tentava focar-me nessa mas também tinha de olhar para os outros. Aconteceu-me uma situação muito chata que é que eu fui perdendo a confiança. À medida que entrava com a apresentação perdia a confiança e já só queria acabar com a apresentação e sair dali o mais rapidamente possível.

O que é que numa situação destas eu poderia ter feito para reconquistar a atenção do meu júri?

Obrigada.

 
Dr.Rodrigo Moita de Deus

Como é que um político pode estar num programa como o "Esmiúça os Sufrágios”? Não foi só esse programa, o "5 para a Meia-Noite” também tem políticos. O sucesso desses programas é conseguirem pôr um político mais, ou menos, naturalmente, na medida possível em que um político pode estar. Por isso é que têm tão boas audiências por comparação com outros programas mais chatos da TVI24 sobre política, em que aquilo é tudo mais ou menos a mesma coisa.

Convidam os entrevistados, fazem as perguntas do costume e ainda por cima não há agressividade ou sangue. Como é que um político pode estar? Naturalmente, sendo mais, ou menos, autêntico.

Aliás, para mim uma das vantagens é que para mim normalmente a maior parte dos políticos são muito mais interessantes do que parecem na televisão. O que é uma coisa extraordinária.

O António Costa respondeu bem, aliás, levou a coisa para a brincadeira ou desvalorizou o assunto, dizendo que era uma patetice ou algo do género, até foi bastante honesto.

Foco: autenticidade, autenticidade, autenticidade e mais um pouco de autenticidade, mesmo neste tipo de programas.

Maria João, relativamente à sua situação, pois é uma situação aflitiva, os professores são umas bestas, não é? Porque eles estão lá para ouvi-la, não é para pegarem no telemóvel.

Acho que podia ter dito isso, que eles são umas bestas, pois acho que é mesmo uma falta de noção.

Relativamente ao que nos traz aqui hoje, porque tem exatamente a ver com aquilo que o Carlos estava a dizer de que quando falamos para uma audiência e ele diz que as pessoas também veem, se você estiver a olhar para as pessoas elas tenderão a sentir alguma vergonha de pegar no telemóvel.

Por exemplo, se eu estive agora aqui a falar com o Carlos e ele quiser pegar no telemóvel, ele sentir-se-á inibido com o meu olhar de o fazer.

Se puser os olhos no papel, enterrada no seu território, é mais seguro, sim, mas as pessoas tenderão sempre a distrair-se.

 
Dep.Carlos Coelho

Muito bem, temos de terminar. Só queria dizer à Maria João o seguinte: concordo com aquilo que o Rodrigo disse, esss professores são umas bestas, quem está no júri não deve estar entretido com outras coisas. Se pudesse ter antecipado isso, mas geralmente não se consegue, teria pensado numa forma diferente de introduzir para chamar a atenção deles.

Confrontada com a situação, a única solução é ignorar. É a mesma situação que qualquer um de nós está numa assembleia a falar e houve barulho, ou bocas irónicas, ou insultos. Portanto, qual é o recado: "os cães ladram, mas a caravana passa”. Temos de ser impassíveis.

Temos de "fazer das tripas coração”, esquecer o que está à nossa volta, se são uns tipos a olhar para o telemóvel, ou a fazer caretas, a mandar-nos bocas, não interessa, "os cães ladram e a caravana passa”. Você tem de ser profissional.

A alternativa era dizer para eles interromperem o que estão a fazer e olharem para si, aí estaria chumbada, não é? Se parar e disser: "Desculpe, estou a interromper as vossas comunicações?”, está lixada.

Portanto, a única forma que você tem é continuar a fazer a sua apresentação. "Os cães ladram, mas a caravana passa” é a mensagem que damos para isto.

Muito bem. O Rodrigo e eu vamos sair. Vocês têm de fazer agora três coisas: a primeira é responder à pergunta "acham que esta sessão foi útil”, fazem-nos levantando o braço quando eles pedirem. Fazendo os vossos votos com um cartão de 5 a 1 com a pontuação que dão à utilidade da sessão, esqueçam os oradores, é mais se isto foi útil para vocês.

Depois, por voto secreto vão ter de responder aos nove requisitos: se o tema é importante, não interessa se gostaram, podem ter odiado, mas têm de dizer se Comunicação é importante ou não, se foi interessante e se vos trouxe novidades.

Avaliam em cada um de nós, Rodrigo e eu, se sabemos da matéria, se comunicámos bem e se geramos empatia. Também avaliam relativamente à organização, se o material que vos foi distribuído é bom ou não, o PowerPoint, os meios audiovisuais e o tempo de duração se está bem assim ou se devia ser mais.

Isso é uma votação secreta que farão à saída depositando na urna. Têm também o "Aprendi Que” em que têm de pôr uma, duas, três coisas que gostaram de aprender e que para vocês constitui algo de mais relevante nesta comunicação.

Muito bem, vamos sair para estarem à vontade.

[APLAUSOS]

 
Nuno Matias

O nosso magnífico reitor já explicou a mecânica das votações, mas antes que eles saiam da sala, quero aproveitar para explicar a questão do "Catch the Eye”, sobretudo à Soraia e ao Manuel Torres, a quem não demos a palavra logo, apesar de se terem inscrito nas primeiras rondas, porque já tinham feito questões na aula.

Por uma questão de equilíbrio e de participação dos alunos mais alargada possível, pois isto não é nenhuma competição, é uma aprendizagem para todos, é para ficarem com esta noção de que não estamos a escamotear os que querem intervir. Mas uma vez que já tinham feito uma questão, demos prioridade aos colegas que ainda não o tinham feito.

Vamos então fazer a votação da utilidade do tema, fila a fila. Pedia que preparassem os cartões que têm nas vossas pastas e pedia à primeira fila para votar em relação à utilidade desta aula.

[VOTAÇÃO]

FIM